Aquecimento de 3 graus vai mudar configuração global 

  

Projeção prevê que floresta tropical passe por processo de savanização; a boreal,
nas regiões árticas, ficaria sujeita ao completo desaparecimento

A Terra pode enfrentar uma realidade completamente nova em cem anos, caso previsões de cientistas se confirmarem e o planeta esquentar apenas 3°C.

Estudo publicado na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences” (PNAS), dos EUA, reúne diferentes modelos e faz projeções amplas do que a humanidade enfrentará neste século e no próximo.

O resultado é uma configuração bastante diferente da atual. Segundo os pesquisadores, todos da Grã-Bretanha, se a temperatura média global subir mais 3°C, florestas desaparecerão, queimadas se tornarão mais freqüentes algumas regiões serão mais sensíveis a eventos extremos e outras passarão a emitir gás carbônico em vez de retirá-lo do ar.

A Amazônia e as latitudes altas são as mais vulneráveis. A floresta abrirá espaço para o cerrado e estará mais suscetível a secas e queimadas.

A floresta boreal, no Ártico, pode sumir. Instalado o cenário, lá para 2100, os riscos continuam a aumentar mesmo se a composição atmosférica se mantiver constante.

Este não é o primeiro trabalho a mostrar os efeitos de pequenas mudanças. Mas a equipe tem o mérito de ter juntado vários dados e de forma consistente.

"Este estudo confirma a vulnerabilidade da biosfera terrestre e do ciclo hidrológico à mudança climática", afirma Bala Govindasamy, climatologista do Instituto Nacional Lawrence Livermore, dos EUA. "Secas e fogo são algumas das conseqüências que nossas gerações futuras enfrentarão”. 

O trabalho segue linha similar ao do climatologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Atmosféricas. Ele também indica que o aquecimento pode levar ao que chama de savanização da Amazônia. "O trabalho é condizente com os resultados que obtive. Todos os dados científicos começam a seguir a mesma direção, a mesma projeção", diz.

Pode causar estranhamento levar cenários tão distantes em consideração - milhares de informações jogadas em programas de computador. Só que governos trabalham cada vez mais com tais projeções para evitar o pior.

Não à toa. A temperatura média global atual é de 14,6°C. Ela tem crescido rapidamente graças ao aumento da concentração de gás carbônico na atmosfera, emitido na queima de petróleo e carvão e desmatamento de florestas tropicais, como a Amazônia.

O último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, grupo ligado às Nações Unidas, indica que a temperatura média global será de 1,4°C a 5,8°C maior em 2100. O próximo relatório, que sai no ano que vem, corrige para de 2°C a 4,5°C.

Carbono

Outra descoberta do grupo britânico, possível graças à união de modelos diferentes em um, é quando as regiões que hoje absorvem o carbono da atmosfera (e assim ajudam a manter o gás em uma taxa equilibrada) passarão a emiti-lo - aumentando a concentração do gás no ar.

Esse fluxo é bastante sensível ao aumento da temperatura. Segundo as projeções, em 2100, com a Terra 3°C mais quente, o risco de sumidouros de carbono se transformarem em fontes será de 44%. "Quanto maior o aquecimento global, maiores os riscos", escrevem os autores na PNAS.

Isso porque mudanças no clima afetam a fotossíntese, quando o carbono é assimilado pelas plantas, e a decomposição da matéria orgânica nos solos, quando o gás é liberado.

Locais como a Amazônia (que é um sumidouro de carbono), transformados em cerrado, absorverão menos, e a maior parte da matéria orgânica do solo terá se convertido em gás carbônico novamente.

A boa notícia é que, se a temperatura não subir tanto, o estrago é menor. Com até 2°C a mais, o risco é de 13%; entre 2°C e 3°C, é de 10%.
 

Estadão, 15/8/2006


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