CARTA DE CURITIBA 

 

Os docentes das instituições de ensino superior, reunidos no 24º CONGRESSO do ANDES-SN, realizado de 24 de fevereiro a 1º de março de 2005, na cidade de Curitiba-PR, com a presença de 356 delegados, 46 observadores e 4 convidados, analisaram e aprofundaram a sua reflexão sobre a conjuntura nacional e internacional. Cientes das responsabilidades que têm diante dos graves problemas que atingem as universidades brasileiras, dos ataques aos movimentos sociais organizados e aos sindicatos e das ameaças decorrentes do crescente domínio do capital e da interferência dos interesses do capital internacional na vida do povo brasileiro, dirigem-se à população brasileira para manifestar a sua veemente crítica à atual política vigente, apresentar suas propostas e deliberações sobre os grandes temas nacionais e a atualização do seu plano de lutas.

Na arena internacional, constataram que a ameaça e a realidade de novas crises financeiras de grande envergadura, com epicentro nos EUA, testemunham a continuidade da crise mundial do capital, da qual se pretende sair por meio da submissão dos trabalhadores e dos povos oprimidos, e por meio da continuidade das políticas neoliberais. Ao mesmo tempo, apontaram a crescente resistência dos povos, na América Latina (na Bolívia, na Venezuela, na Argentina e no Equador) e no mundo inteiro, com destaque para as heróicas resistências dos povos iraquiano, palestino e haitiano às ocupações militares e à política imperialista sustentada pelo capital financeiro.

Os congressistas manifestam sua solidariedade à luta desses povos e reafirmam a sua disposição de realizar esforços na integração mundial das lutas de todos os trabalhadores na defesa de suas conquistas e no combate às imposições do capital.

O Governo Lula da Silva mantém sua firme determinação de submeter o país aos interesses internacionais, por meio de um conjunto de medidas como a contra-reforma da Previdência, a Inovação Tecnológica, a liberação dos transgênicos, a Lei de Falências e a Lei das Parcerias Público-Privadas. Acrescenta agora, “as reformas” sindical e universitária. No seu conjunto, o governo amplia o espaço das ações que favorecem o campo privado, desobrigando o Estado de seu papel precípuo de sustentação do que é público e do interesse dos cidadãos.

Em nome da modernização do Estado, avalizadora e garantidora da governabilidade, o país retrocede na distribuição de renda e na criação de empregos dignos. A economia, quando cresce, atende às demandas do capital e amplia a sua inserção subordinada na economia mundial capitalista.

A recente onda de assassinatos no campo, na floresta, e nas periferias nos estados do Pará, Goiás e Rio de Janeiro, demonstram que a realidade social do país não mudou, que por trás das mudanças políticas de fachada, que tantas ilusões despertaram no povo brasileiro, as classes dominantes continuam as mesmas. O suposto empresariado agrário “moderno”, vinculado ao agronegócio, figura central do governo Lula, não vacila, tal qual os velhos latifundiários baseados na grilagem de terras, em utilizar trabalho escravo, jagunços e o recurso ao massacre para defender seus interesses de classe, vinculados por mil laços ao capitalismo internacional.

Os docentes do ANDES-SN, em seu 24º CONGRESSO, declaram sua total solidariedade à luta dos trabalhadores sem terra e seu repúdio às ameaças de morte e às chacinas de lutadores e lutadoras sociais, renovando sua disposição de luta, ao lado de todos os trabalhadores do país, contra a opressão e a exploração de classe.

O 24º CONGRESSO atualizou o plano de lutas do ANDES-SN, com ênfase na discussão política sobre os rumos do Sindicato, centrada, principalmente nas reformas sindical e universitária e nas campanhas salariais.

Tratou detalhadamente da reforma universitária, que está sendo preparada pelo governo, e considerou que o pressuposto básico de tratar a universidade como um bem público não-estatal é incompatível com a defesa da universidade pública,  gratuita e de qualidade. Os docentes do ensino superior não abrem mão do seu projeto de educação para o país. Sustentado pelas propostas do ANDES-SN para a universidade brasileira, no Plano Nacional de Educação - PNE da sociedade brasileira, o 24º CONGRESSO analisou e definiu uma “agenda para a educação superior: uma proposta do ANDES-SN para o Brasil de hoje”, para balizar as ações do Sindicato em prol da educação pública e da universidade brasileira e dialogar com a sociedade brasileira e, em particular, com os movimentos sociais que combatem o  racismo, definindo, na agenda, política afirmativa articulada a partir do fortalecimento das escolas públicas de ensino médio nos territórios de maior negação dos direitos sociais que, a partir da interação com as universidades públicas e cefets, deverão garantir acesso diferenciado para os estudantes dessas escolas. As definições da agenda se opõem diretamente ao PROUNI, à Lei de Inovação Tecnológica e ao SINAES, a primeira expressão complementar da política governamental de utilização de recursos que seriam fundamentais para a universalização do ensino superior público, para favorecer os empresários da educação superior privada.

O 24º CONGRESSO considerou, ainda, que o processo adotado pelo governo de discussão da reforma universitária, feito de cima para baixo, simulando uma discussão democrática, contraria e ameaça a universidade pública e gratuita. Por isso, exige que se abra um novo campo de discussão, realmente democrático, sem atropelos, sem imposições de sua agenda política, para o debate sobre a universidade pública e gratuita – um patrimônio nacional -, construída pelos esforços de todos os brasileiros, cuja manutenção, avanço e universalização de acesso é uma exigência para a independência nacional na produção do saber, da ciência e da tecnologia, da arte e da cultura.

O 24º CONGRESSO considera que a luta em defesa dos direitos da categoria é parte constitutiva da luta em defesa da educação pública e gratuita. Na atual conjuntura, a coalizão governante tem imposto um retrocesso às conquistas dos docentes com medidas que atingem diretamente seus direitos. A precarização do trabalho docente, o arrocho salarial, a perda de direitos trabalhistas, com valorização do individualismo e da competição, além dos ataques à organização sindical autônoma são os nexos que, do ponto de vista do governo, dão corpo ao seu projeto para a educação superior brasileira. A luta por direitos e por condições de trabalho e salários condizentes com a profissão são condições basilares para se alcançar um padrão unitário de qualidade.

O 24º CONGRESSO repudia todas as formas precarizadas de contratação, exige a liberdade de organização sindical e entende que a qualidade da educação superior somente terá alcance se houver a articulação do ensino, da pesquisa e da extensão. Reafirma que na esfera pública é fundamental o fortalecimento das articulações com os demais servidores das esferas federal e estadual e que, no plano das IES particulares, é necessário reforçar a luta para que os docentes das instituições de ensino particular tenham seus direitos de organização autônoma reconhecidos no ANDES-SN, que seja barrada a violência, a prepotência e o mandacionismo dos mercadores da educação.

O governo Lula, apoiado no Fórum Nacional do Trabalho, do qual faz parte a CUT, encaminhou uma reforma sindical que visa a estrangular os sindicatos e a representação de base, reforçando o poder das cúpulas burocráticas das centrais e, também, ainda que proclame o contrário, a ingerência estatal e patronal nas organizações dos trabalhadores. A reforma sindical visa, ainda, a aniquilar a resistência dos trabalhadores, com vista a impor a reforma trabalhista, baseada no malfadado mito do “Custo Brasil”, a qual objetiva retirar os direitos básicos dos trabalhadores, conquistados na luta  (décimo terceiro, férias, licença-maternidade e outros) e impor a completa flexibilização do trabalho, cenário de barbárie, que  é o grande objetivo do capitalismo “global”. A completa adaptação da CUT a esse cenário e a essa perspectiva que pretende não combater, mas gerenciar, foi avaliada pelas assembléias de base. A partir dessas avaliações, o 24º CONGRESSO deliberou a desfiliação do ANDES-SN da CUT.

Essa decisão é tomada de forma clara, tendo como parâmetro a defesa do sindicalismo classista, autônomo e democrático, opondo-se ao sindicalismo comprometido com a total adaptação das burocracias sindicais à ordem existente.

O Andes-SN continuará, ao longo de 2005, empenhando-se na construção de um pólo de resistência sindical às reformas do governo Lula, na defesa do movimento sindical, autônomo, classista e combativo e que caminhe no sentido da unidade entre trabalhadores do campo e da cidade, do setor público e do privado, bem como de formalizados e precarizados.

O 24º CONGRESSO reafirma os princípios de autonomia e liberdade do ANDES-SN em relação aos partidos, estados e patrões e este dispõe-se a intensificar, em conjunto com suas seções sindicais, a participação em fóruns como a CNESF, o CONLUTAS, em fóruns estaduais de luta, entre outros, os de defesa dos serviços públicos, aliados aos movimentos sociais, no combate às reformas do governo Lula: sindical, trabalhista e universitária.

O 24º Congresso reafirma, ainda, a organização do Sindicato a partir dos locais de trabalho, o direito de greve e a liberdade e autonomia sindicais, com a sustentação voluntária de seus sindicalizados, requisitos sobre os quais se baseia desde a sua fundação, como fundamentais para a organização e manifestação dos docentes. Reafirma, também, a necessidade imperiosa de construir com toda a classe trabalhadora a luta de emancipação para com ela caminhar na construção de uma sociedade socialista.

Reafirma o compromisso histórico do Sindicato de lutar em conjunto com todos os movimentos sociais por um projeto de sociedade socialista, democrática e emancipadora e de continuar na luta e na resistência, mantendo-se firme e coeso na defesa dos trabalhadores, da universidade pública e gratuita, na certeza de que a história não pára e não parou por ordem dos dominantes. A história, temo-la feito, e continuaremos fazendo-a como demonstra a luta de todos os povos.

Sem vergar, alcançaremos nossos objetivos!

Todos juntos, à construção dessa história! 

 

Curitiba – PR, 1º de março de 2005.

 

Fonte: ANDES-SN, 04/03/2005


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