CARTA  DE  TERESINA

 

Às vésperas de mais um anunciado holocausto promovido pela necessidade do capital imperialista de reconstituir seus lucros e avançar numa ainda maior concentração de poder econômico e militar, no controle geopolítico sobre as fontes petrolíferas e toda a região do Oriente Próximo, via imposição de uma guerra covarde e genocida, 356 delegados e observadores, representando 67 (sessenta e sete) Seções Sindicais reuniram-se, no 22º CONGRESSO do ANDES-SN, em Teresina, Piauí, de 8 a 13 de março de 2003, para aprovar o Plano Geral de Lutas do Sindicato, frente aos imensos desafios colocados pela conjuntura nacional e internacional.

Mais do que nunca é preciso dar à palavra mudança o significado de transformação social. A postura de autonomia sindical é essencial para o desenvolvimento da luta.

O 22º CONGRESSO do ANDES-SN reafirmou sua solidariedade internacionalista ao povo do Iraque, à heróica luta do povo palestino, exemplo histórico de resistência popular antiimperialista e à luta de todos os povos latino-americanos, em especial, neste momento, com os trabalhadores da Argentina, Bolívia e Venezuela que, resistindo à ofensiva do capital e aos golpes imperialistas, apontam uma perspectiva de transformação revolucionária que abre uma nova etapa da luta pela unidade socialista da América Latina.

O balanço realizado no 22º CONGRESSO confirma o quadro de crise generalizada no mundo e, em especial, na América Latina, território onde se realizam profundos processos da luta das massas contra a exploração capitalista e as avassaladoras investidas imperialistas para impor o domínio americano sobre todos os povos, classes trabalhadoras e nações. A implementação das políticas neoliberais, cujo cerne é a retirada de direitos dos trabalhadores, é viabilizada pelas chamadas reformas do Estado.

Essas políticas vêm, há mais de uma década, se traduzindo em abertura desregrada das fronteiras nacionais, perda do patrimônio nacional, privatizações, desarticulação das cadeias produtivas, endividamento externo, aprofundamento da dependência. As contra-reformas empreendidas por FHC trouxeram conseqüências dramáticas: desemprego, trabalho precário, destruição dos serviços públicos, ataques a direitos e conquistas históricas dos trabalhadores. O que surpreende é que hoje se pretenda, como ontem, com Collor e FHC, fazer do funcionalismo público o responsável pela crise que vivemos, desviando a atenção dos verdadeiros responsáveis pela secular exploração e opressão do nosso país, a saber, o grande capital internacional, sobretudo financeiro, suas instituições e seus aliados e as classes dominantes brasileiras.

As políticas e medidas até aqui anunciadas pelo governo, na continuidade da Carta aos Brasileiros (Julho de 2002), de manutenção do acordo de agosto/2002 com o FMI (firmado por FHC), de constituição de um ministério a que são alçadas figuras empresariais como Henrique Meirelles, Luiz F. Furlan e Roberto Rodrigues chocam-se frontalmente com as aspirações dos trabalhadores responsáveis pela vitória eleitoral.

Premido pela expectativa popular e pelo protagonismo das massas, por um lado, e pelas exigências ditadas pelo imperialismo, por outro, o governo atual aplica e aprofunda a política macroeconômica dos que foram derrotados nas urnas, em 2002: continuidade do pagamento da divida externa, elevação do superávit fiscal primário para 4,25% do PIB, elevação da taxa básica de juros para 26,5% e, sobretudo, a continuidade da política salarial e das reformas indicadas por FHC. Nenhuma política econômica foi alterada. Todas foram reforçadas.

No centro da continuidade das "reformas", está a da Previdência. O governo acaba de anunciar a urgência na votação do PLP 09/99, pressionando o Congresso Nacional para acelerar a sua tramitação. A eventual aprovação do PLP regulamentaria os dispositivos da EC nº 20/98, que fixa um teto para a aposentadoria dos servidores e introduz a Previdência Complementar Privada. O caminho da privatização integral da Previdência estaria aberto, bem como se estabeleceria um vasto terreno de rapina para as seguradoras. A esta política o povo brasileiro já disse NÃO repetidas vezes, inclusive nas eleições de 2002.

Eis porque nos negamos a abrir mão do direito de estabelecer nossas pautas de reivindicações, de organizar a luta pelo seu cumprimento e negociar com governos e patrões a partir delas. E não reconhecemos como instância de negociação o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, instrumento privilegiado para a elaboração e legitimação de medidas que tentam suprimir o inalienável direito dos trabalhadores de lutarem e negociarem a partir dos interesses exclusivos da classe. Ao tentar-se diluir estes interesses, no âmbito de um ilusório bem comum social, ataca-se não só a independência dos sindicatos, mas a base da própria democracia, a saber, o direito de livre expressão política dos interesses de classes contraditórios e antagônicos. A composição do CODES, feita por indicação governamental e sem qualquer consulta à sociedade, com uma esmagadora maioria das classes patronais, de empresários, membros do governo e de ONGs, contra uma pequena minoria de representantes dos trabalhadores, indica o seu caráter legitimador das propostas que visam à destruição das conquistas sociais e democráticas das maiorias populares. Por isto, votamos que a CUT, Central única dos Trabalhadores, à qual estamos filiados, saia do Conselho. Por isto, dizemos: negociação, sim; pacto social, não!

O 22º CONGRESSO do ANDES-SN expressou sua firme convicção de que o povo trabalhador não abrirá mão da vitória obtida contra FHC, em 2002, e não aceitará que os derrotados e os exploradores sigam ditando a política do país. Nós, docentes das universidades brasileiras, temos completa confiança em que, ao lado dos demais trabalhadores, saberemos dar seguimento às vitórias de 2002, agora pelo método da luta cotidiana, fundada na independência e autonomia de nossas entidades.

Organizamos, desde já, nesse espírito, a resistência ao PLP 09/99 para barrar sua tramitação e conquistar sua retirada. Para tanto, o 22º CONGRESSO do ANDES-SN encaminha para apreciação das suas Seções Sindicais o indicativo de greve com o conjunto dos servidores públicos do país.

O 22º CONGRESSO compreende que esta luta diz respeito ao conjunto dos trabalhadores, particularmente aos servidores públicos, razão pela qual o movimento docente irá se empenhar no fortalecimento da articulação com as demais categorias dos servidores, em âmbitos federal, estadual e municipal e exigirá que a CUT tenha papel relevante na organização da luta.

O lugar estratégico que devem ocupar a luta sindical e as tarefas do sindicalismo classista, independente e autônomo, assume, portanto, um caráter necessário, urgente e vital. Não podemos somente reagir a medidas encaminhadas e aprovadas ou legitimar propostas de reforma.

O papel do sindicalismo classista e combativo é agir, barrar, impor derrotas à pretensão do capital de fazer dos países endividados os financiadores da guerra e fazer dos direitos duramente conquistados, em anos de luta, fonte de lucros do capital especulativo. Contra o discurso que pretende que o sindicalismo rebaixe suas bandeiras e abra mão de seus meios de luta, sob pena de incorrer em "corporativismo", reivindicamos para os trabalhadores a vigência da organização de classe independente.

Ao discutir seu Plano de Lutas, o ANDES-SN reafirma suas bandeiras históricas: contra as guerras imperialistas; Contra a militarização da América Latina e a política imperialista em todo o mundo; Contra a entrega da Base de Alcântara; Não à ALCA e OMC; Por um plebiscito oficial sobre a ALCA; Pela retirada do governo brasileiro das negociações da ALCA; Contra a Reforma da Previdência, em defesa da previdência pública, solidária, em regime de repartição; Não ao PLP 09/99 ou qualquer reforma que institua a previdência complementar e os fundos de pensão; Em defesa da educação pública, gratuita, laica, de qualidade e socialmente referenciada, em todos os níveis, e dos serviços públicos em geral; Pela liberdade de organização e prática sindicais; Pela recuperação de perdas históricas e estabilidade no emprego; Reajuste salarial já! Fora o FMI! Não ao pagamento da dívida externa; Reforma agrária sob controle dos trabalhadores; Contra as reformas que atacam as conquistas e as condições de vida dos trabalhadores; Contra as "reformas" e pactos que retirem direitos dos trabalhadores; Negociação, sim, pacto social, não; Pela reestatização das empresas privatizadas; Contra a participação no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social; Não à autonomia do Banco Central; Fora Israel dos territórios ocupados da Palestina.

O 22º CONGRESSO aprofundou a discussão da nossa organização democrática e aprovou alterações estatutárias como a criação das Seções Sindicais Multiinstitucionais, no sentido de ampliar e fortalecer a organização na base e ampliar as possibilidades de sindicalização dos que vêm sofrendo a forte investida da superexploração do trabalho docente nas instituições particulares de ensino.

As políticas sociais aprovadas no 22º CONGRESSO apontam, ainda, para a defesa da educação pública, gratuita, laica, socialmente referenciada, indicam o PNE da sociedade brasileira como parâmetro para as definições na política educacional, defendem o projeto de universidade do ANDES-SN, historicamente construído pelo Movimento Docente, que prevê a autonomia universitária, segundo o Artigo 207 da Constituição Federal, o financiamento público para a educação pública, a carreira e política de capacitação docente. Apontam também a rejeição do Projeto de Lei de Inovação Tecnológica.

Com esta orientação, o ANDES-SN continuará participando das lutas internacionais e nacionais contra a ALCA e a OMC e contra a mercantilização dos serviços públicos. Participará da CNESF e entrará nos congressos estaduais e nacional da CUT para que esta adote um preciso programa e plano de lutas contra as reformas de destruição dos serviços públicos, impulsionando, assim, a perspectiva classista e combativa do sindicalismo, no Brasil, colocando-nos na primeira fileira dos que buscam fazer com que o sentido da mudança seja o das transformações sociais.

A população brasileira indicou, claramente, sua vontade de alterar as condições políticas e sociais que vêm, secularmente, destruindo e negando sua possibilidade de existência. O ANDES-SN reafirma a necessidade e o desejo de ser sujeito histórico ativo nas lutas pelo processo de transformação social.


Teresina, 13 de março de 2003

 

Fonte: ANDES-SN - 21/03/2003.


 

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