A ciência quer vencer a religião 

  

A descoberta da origem do Universo tornará Deus obsoleto, dizem pensadores

Toda virada de ano, o site Edge.org faz a algumas das melhores mentes do planeta uma pergunta vaga. Suas respostas para 2007 estão listadas em 16 telas da web, um calhamaço impresso de 230 páginas.  

São 150 homens e mulheres no total, organizados por nenhuma ordem específica, prêmios Nobel, editores de revistas, blogueiros notáveis, pioneiros em campos vários, todos ligados intimamente à ciência tentando explicar – e esta é a pergunta deste ano – o que faz deles otimistas. 

A pergunta é vaga e a resposta, num ano para o qual se antecipam guerras e desastres ambientais, difícil. Mas eles encontram otimismo porque têm métodos próprios para enxergar os fatos. Se há guerras, o que analisam são os números.  

Na estatística, há um declínio de guerras. Quem é da ciência acha que as guerras vão acabar. 

Assim como acham que Deus acabará por obsoleto. É que algo está para ser descoberto que lançará o mundo em um novo Renascimento, um novo Iluminismo.  

Isto começará com a inauguração, na Suíça, durante o verão europeu, do maior e mais sofisticado acelerador de partículas da história. Ele poderá emular o comportamento dos átomos na hora do Big Bang. 

Cada ciência é movida por uma questão fundamental. A da biologia, como explica o evolucionista Richard Dawkins, foi resolvida por Charles Darwin faz um século: qual a origem da vida? Os físicos estão chegando perto, muito perto, de sua resposta para qual a origem do Universo. 

É poesia à moda da ciência, do tipo que se explica em equações e para a qual traduções só existem na forma de metáforas. Mas quando a origem do Todo for conhecida, aos poucos será compreendida. Aí, satisfará o lugar que Deus ocupa entre as pessoas, alegam os cientistas. 

O físico Marcelo Gleiser, da Universidade de Darmouth (EUA), único brasileiro da lista, se incomoda com o conflito entre religião e ciência. “Não dá para esquecer o que está por trás da experiência religiosa”, diz Marcelo. “É esperança. A vida é difícil, a religião oferece segurança.”

O caminho para ele, que é ateu como seus pares, é tentar mostrar como a ciência pode ser um instrumento para a compreensão e respeito pela vida. Vida é o que está por trás de todos os comentários, sempre. 

Seja no fim das guerras, no fim dos dogmas religiosos, seja numa maior longevidade. Viveremos para além dos 100 - e bem-dispostos. Seremos melhor educados, teremos mais acesso – como já temos – a informação. Viveremos em Marte. 

Rodney Brooks, diretor do Laboratório de Inteligência Artificial do Instituto de Tecnologia do Massachusetts (MIT, nos EUA), acha que já nasceu o primeiro morador de Marte. Paul Davies, físico da Universidade do Arizona (EUA) tem um projeto para isto.  

Suprimentos e material para construção da primeira colônia além órbita podem ser enviados anos antes da viagem tripulada. Como a viagem é longa, melhor lançar mão de aventureiros que se disponham a ir sem voltar. Não é muito diferente do tempo dos descobrimentos. 

O que chamam de novo Iluminismo incluirá uma maior compreensão de quem somos. Freeman Dyson, um dos maiores físicos vivos, está de olho em HAR1, um detalhe de nosso DNA descoberto na Universidade da Califórnia em Santa Cruz. 

É um trecho de código genético encontrado em aves e mamíferos que varia pouco entre as espécies, mas aparece mais modificado entre os primatas. Só o nosso que é particularmente diferente. 

Como está em tantos bichos, parece ser importante e essencial, embora não se saiba o porquê. Ali em HAR1, pode estar o que faz de nós, por falta de melhor palavra, humanos. 

Dentre os 150 nomes, os Dyson têm lugar de destaque. São três da família. Além de Freeman estão também seus filhos Esther, uma das mais badaladas consultoras da área de tecnologia, e George, historiador da ciência. 

Fundamentalmente o que move o otimismo científico é a crença – de maneira alguma fé, mas confiança – na humanidade.  

Nas palavras do historiador evolucionista Jared Diamond, as melhores escolhas são justamente as escolhas que são feitas.  

Pondo de outra forma, é como diz Joel Garreau, do Washington Post: o homem típico é como o Han Solo de Guerra nas Estrelas. Mal encarado mas, no fim, faz o que é certo.

 

Fonte: O Estado de S. Paulo, Pedro Doria, 7/1/2007.


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