Fator: governo tem Plano B

 


 

Ministério da Previdência estuda como alternativa ao redutor de aposentadoria impor ainda
mais tempo de trabalho para ter direito a benefício. Mas o ganho, segundo especialista,
não compensaria
 

Técnicos do governo estudam alternativas ao fator previdenciário — que pode ter o fim decretado na Câmara, em projeto aprovado no Senado. Documento do Ministério da Previdência revela que o novo cálculo não mexe na renda do trabalhador que pretende se aposentar, como faz o fator, mas joga para a frente (e muito) a idade da aposentadoria. Segundo especialista, uma pessoa de 50 anos, por exemplo, teria que trabalhar 18,5 anos a mais. O ganho na aposentadoria, no entanto, seria de apenas 3,51%. 

A “fórmula do ponto fixo”, como vem sendo chamada, combina idade, tempo de contribuição e expectativa de vida, segundo a tábua divulgada pelo IBGE, todos os anos. O tempo de contribuição passaria a ser igual à expectativa de vida, multiplicada por 1,87 (constante fixada pelos técnicos que elaboraram o estudo). O valor do benefício não é mais afetado, como no fator, e o segurado recebe o referente a 80% do valor das maiores contribuições. A duras penas (veja tabela)

Segundo o advogado especializado em Previdência Marco Anflor, o impacto do estudo do governo para uma pessoa de 50 anos pode levar a uma exigência de mais 18,5 anos de trabalho, para um ganho de 3,51%. “O tempo médio de aposentadoria hoje é de 51,5 anos para mulheres e de 54,5 anos para homens. O que o governo vai produzir, com isso, é uma média mínima de 56 anos para mulheres e de 58 anos para os homens”, analisa. Se o fator não é vantagem, essa fórmula adia ainda mais a aposentadoria. 

Essa pessoa de 50 anos, pela expectativa de sobrevida, segundo tábua do IBGE, teria 28,6 anos a mais. Se ela tem uma renda de R$ 2.712,69, pelo fator previdenciário atual, poderia se aposentar (já cumpriu 30 anos). Seria aplicado o fator 0,9661 e ela se aposentaria com R$ 2.620,73. “Pela opção do governo, teria que trabalhar 48,5 anos. Como ‘só’ trabalhou 30, ela precisará trabalhar mais 18,5 anos. Mas quem é que vai querer trabalhar mais 18,5 anos para ter ganho de 3,51% no benefício?”, questiona o advogado. 

Outro exemplo é o de mulher de 59 anos. Hoje, ela teria sobrevida de 21,7 anos. Precisaria trabalhar 35,6 anos. A renda, pelo fator, seria de R$ 2.669,67. Pelo “ponto fixo”, ela teria de cumprir mais 5,6 anos, para um ganho de renda de 0,48%. Um homem de 64 anos teria expectativa de vida de 18,2 anos e trabalharia um ano a menos. E seu benefício ficaria 1,17% abaixo dos R$ 2.744,70, com o uso do fator. 

Para a presidente da Federação das Associações dos Aposentados e Pensionistas do Rio de Janeiro, Yedda Gaspar, o substituto para o fator deve ser discutido com toda a sociedade e representantes de aposentados e trabalhadores: “O fator previdenciário já foi o responsável por muitas perdas salariais dos aposentados”. 

RECURSO GEROU PERDAS NA MÉDIA DAS CONCESSÕES 

O presidente da Associação Nacional dos Servidores da Previdência Social e da Seguridade Social (Anasps), Paulo César Régis de Souza, classifica como “inaceitáveis” as pressões que o governo fez contra a aprovação pela Câmara dos Deputados da proposta, aprovada pelo Senado, que acaba com o fator previdenciário. “Nos últimos 10 anos do fator, o déficit da Previdência chegou a R$ 236,8 bilhões, (10,15% do Produto Interno Bruto de 2007), dos quais R$ 190, 4 bilhões só na era Lula (8,16% do PIB). Portanto, foi uma baita farsa aplicada aos segurados e beneficiários da previdência”, criticou, avaliando que a economia de R$ 10,1 bilhões, obtida a partir do fator, é ínfima. 

Dados do DatAanasps revelam o achatamento contínuo do valor médio dos benefícios no momento da concessão após o fator previdenciário: R$ 304 em 2000 (salário mínimo de R$ 153); R$ 339,81 em 2001 (mínimo de R$ 175); R$ 379,66 em 2002 (mínimo de R$ 198); R$ 451 em 2003 (mínimo de R$ 234); R$ 471,65 em 2004 (mínimo de R$ 257); R$ 524,70 em 2005 (mínimo de R$ 290); R$ 579,10 em 2006 (mínimo de R$ 340); R$ 614,76 em 2007 (mínimo de 373) e R$ 654,87 em março de 2008 (mínimo de R$ 415). Para a Anasps, o fator previdenciário deve ser substituído pela determinação de uma idade mínima. 

Agora, todos aprovam o fim 

Embora todos digam agora que são favoráveis ao fim do fator, a votação, considerada polêmica, foi adiada para depois do primeiro turno das eleições, graças ao pedido de vista do deputado Chico D’Angelo (PT-RJ). Até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desde o início do ano afirmou que vetaria o projeto que põe fim ao fator, voltou atrás na semana passada e disse que pretende sancioná-lo, mesmo diante do risco de aumentar o déficit previdenciário. 

Segundo o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Arthur Henrique, todas as centrais já se mostraram contrárias ao fator previdenciário. “A CUT é favorável ao fim do redutor. Ele só foi adotado porque o Congresso não aprovou, por um voto de diferença, a idade mínima para a aposentadoria. O fator é extremamente prejudicial ao conjunto de trabalhadores e, mais ainda, para as mulheres, que têm uma expectativa de sobrevida maior”, avalia.
 

 

Fonte: O Dia, Luciene Braga, 22/9/08.

 


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