Cópia de livros didáticos agora é caso de polícia

 

      Editoras se mobilizam para impedir o hábito de tirar xerox de obras nas universidades  

LUCIA MARTINS (O Estado de S. Paulo – 11/11/2002)
 

RIO - Irritados com o não-cumprimento da lei de direito autoral em universidades do País inteiro, os donos de editoras estão apelando para a polícia para apreender cópias feitas sem autorização. Eles pretendem interromper a reprodução ilegal que causa prejuízo de R$ 350 milhões anuais e está levando autores a desistir de escrever livros didáticos. Este ano, a Associação Brasileira para a Proteção dos Direitos Editoriais e Autorais (Abpdea) conseguiu que a Justiça determinasse apreensões em 30 instituições de ensino, o dobro das que ocorreram em 2001.

Para a Abpdea, o apelo à polícia não resolve o problema, mas demonstra que as tentativas de negociação entre as editoras e os estudantes não estão funcionando. De um lado, estão os autores que não conseguem receber pelo seu trabalho, como estabelece a Lei 9.610, de 1998. De outro, os estudantes que não têm dinheiro para comprar os livros e precisam recorrer às cópias ilegais, os xerox.

"É uma questão antiga, mas decidimos agir. Sabemos que a polícia não vai resolver, mas achamos que ela pode ajudar a chamar as instituições para conversar", explica Mauro Lorch, tesoureiro da Abpdea.

Lorch afirma que na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) essa estratégia funcionou. Depois de duas apreensões de cópias - uma delas com prisão do dono da máquina de xerox - a universidade garantiu que vai substituir as copiadoras por mais livros nas bibliotecas.

Em troca, as editoras farão doações de publicações para aumentar o acervo da UFMG e possibilitar que alunos consigam ler os livros sem apelar para a reprodução. Lorch explica que seria impossível para as editoras fazer doações para todas as universidades públicas, mas admite que elas pensam em dar descontos para as instituições que queiram reduzir o problema.

Ovo ou galinha - "Queremos fazer acordos porque, além do prejuízo, estamos perdendo muitos autores que se recusam a escrever porque não ganham direitos autorais", afirma. Representantes das universidades públicas argumentam que, mesmo com descontos, seria muito difícil equipar as bibliotecas.

O reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Carlos Lessa, explica que o orçamento da universidade é apertado e não permite que o problema seja resolvido.

Ele admite que existem máquinas de xerox em quase todas as unidades e que há necessidade de achar saídas para o problema.

"É como a história do ovo e a galinha. O livro é caro porque ninguém compra e ninguém compra porque é caro." Para Lessa, a melhoria das bibliotecas poderia reduzir o caso das reproduções ilegais. Autor de 12 livros na área de economia, Lessa revela que ganha apenas R$ 7 mil por ano com direitos autorais.

O chefe do Departamento de Direito Penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Sergio do Rego Macedo, concorda com a necessidade de melhorar as bibliotecas, mas ressalta que as editoras também precisam achar formas de baratear os livros. "Eles têm de fazer edições menos luxuosas e tentar baixar os preços", afirma.

Essa também é a principal reivindicação dos estudantes. Aluna do primeiro semestre de Educação Física na Uerj Fernanda Cardoso Barros conta que acabou de comprar a cópia inteira de um livro de anatomia por R$ 30. Na livraria, a publicação custaria R$ 300. "Até gostaria de comprar, mas não dá. Ninguém gosta de fazer xerox, todos preferem ter o livro na estante, mas é tudo muito caro."

Fernanda Bertolossi, estudante do terceiro ano de Letras da Uerj, concorda, mas diz que evita comprar cópias de livros inteiros. "Sei que é ilegal e prefiro copiar apenas os capítulos. Mas, são poucas as vezes em que a gente acha o que procura na biblioteca."

Apreensões - A Uerj sofreu duas apreensões em suas copiadoras nos últimos meses. Em toda a universidade, há quase 20 pequenas lojas com máquinas de xerox. Até mesmo dentro das bibliotecas os alunos podem fazer reproduções.

A biblioteca do 12.º andar, que reúne o acervo dos cursos de comunicação social, educação, nutrição e psicologia, tem uma máquina de xerox na porta de entrada, mas um cartaz alerta aos alunos que é proibido reproduzir o livro inteiro. A chefe da biblioteca, Mariangela da Veiga Figueiredo, afirma que é contra a existência da máquina. "Acho errado a máquina aqui, mas nós colocamos para evitar que os livros sejam destruídos quando copiados em outros lugares."

Apesar de atender a quatro cursos, a biblioteca tem um acervo pequeno e deficitário. São 5 mil títulos, com, no máximo, três exemplares de cada. "É muito pouco. Todos os dias saem novas publicações, mas a biblioteca não consegue acompanhar. E sabemos que muitos alunos realmente não têm condições de comprar esses livros. A solução, infelizmente, é a cópia."

 

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