Cotas nas universidades públicas
Áurea Pimentel Pereira*

 

Tramita, no Congresso Nacional, projeto de lei, em que se discute a instituição, nas universidades públicas, de um sistema de reserva de cotas de vagas, destinadas a beneficiar candidatos, ao ensino superior, que tenham cursado estabelecimentos públicos, benesse que se propõe seja estendida a índios e negros.

A proposta é, demagógica, discriminatória, socialmente injusta, constituindo, verdadeira aberração, que nem se entende como tenha podido ser concebida, maculada, que se encontra, ademais, pelo vício da inconstitucionalidade.

É mais um desrespeito que se pretende consumar, contra a Carta Política do país, fato que nem surpreende mais, desfigurada que vem sendo ela, desde a sua promulgação, em 1988, pelas inúmeras emendas que têm sido introduzidas em seu texto - até a presente data quarenta e nove - algumas delas aprovadas visando a adaptá-la aos fracassados planos econômicos implantados no país, outras idealizadas com o objetivo de equilibrar as contas da Nação (caso da Emenda Constitucional 41/04, que realizou, no país, a reforma previdenciária mais perversa de que já se teve notícia).

Agora, a pretexto de promover justiça social, no campo da educação, quer o legislador garantir, o acesso a ensino superior, de forma privilegiada, a alguns, em detrimento de outros, em clara violação a norma pétrea da Lei Maior, (artigo 5º, caput), que alinha dentre os direitos e garantias fundamentais, o princípio da igualdade de todos diante da lei: sem distinção de qualquer natureza.

O que na verdade está se pretendendo, com a edição da referida lei, é institucionalização de privilégio em favor de integrantes de determinada classe social, raça e cor, em frontal antagonismo com a norma do inciso IV do art. 3º da Carta Magna, expressa ao garantir, a todos, igualdade de tratamento, independentemente: de origem, raça, sexo, cor, idade.

Sempre, entendemos que, o que deve ser levado em conta para o acesso às universidades, deve ser o preparo intelectual e a qualificação dos candidatos.

A norma do inciso V do art. 208 da Constituição Federal, parece referendar esse entendimento, quando - ao declarar que constitui dever do Estado garantir acesso aos níveis mais elevados de ensino, teve o cuidado de condicionar: segundo a capacidade de cada um.

No Brasil, as autoridades constituídas têm falhado, lamentavelmente, em relação ao cumprimento do dever que a Constituição Federal lhes atribui de proporcionar nas escolas públicas, ensino de boa qualidade, que possa garantir formação para o trabalho, como previsto nos incisos III e IV do art. 214. Paga mal a seus professores. Não investe no seu aperfeiçoamento.

Para se redimir de tais falhas, diante dos segmentos mais carentes da sociedade, estão ditas autoridades pretendendo, então, instituir, nas universidades públicas, um sistema de reserva de cotas de vagas que, além de absolutamente injusto, repita-se, viola normas pétreas da Constituição Federal.

Como o projeto de lei está, ainda, em discussão, é de se esperar que o bom senso de nossos legisladores prevaleça, para que não se tenha de bater às portas do Pretório Excelso para corrigir mais uma violação do texto de nossa Carta Política.

*Desembargadora

Fonte: Jornal do Brasil, 03/03/2006.


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