Crise, virtudes e oportunidades

 

Importação de equipamentos e insumos eleva o custo da pesquisa no Brasil
 

A qualidade e o dinamismo da produção científica brasileira são incontestáveis. Em muitas áreas - como na biotecnologia, genômica e imunologia, apenas para citar alguns exemplos - já se atua na fronteira do conhecimento. Noutras, como engenharia, física e ciências agrárias, as pesquisas ganham competitividade e projeção internacional. Essa posição de destaque que vem sendo conquistada nos últimos anos deve ser considerada um grande feito, porque fazer pesquisa no Brasil custa caro. O país ainda consolida a sua infra-estrutura de ciência e tecnologia, o que exige investimentos pesados na compra de equipamentos de ponta, insumos e serviços, que, em sua quase totalidade, são importados e cujos gastos são feitos em dólar.

Importam-se equipamentos como microscópios, cromatógrafos, centrífugas, freezers de baixa temperatura, laser s , espectofotômetros, entre outros. Isso sem falar nos materiais utilizados nas pesquisas, como reagentes perecíveis, explosivos, corrosivos, pipetas, ponteiras e até animais vivos. Apesar das gestões do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) com a iniciativa privada, nos últimos anos, e do know-how na confecção de produtos e protótipos acumulado nas próprias universidades e institutos de pesquisa, a empresa nacional, provavelmente pela ausência de uma política de incentivos, ainda não se interessou em produzir equipamentos ou insumos similares.

O Brasil investe cerca de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) em pesquisa e desenvolvimento, algo em torno de US$ 5 bilhões. Pelo menos 60% desses gastos, US$ 3 bilhões, portanto, são de responsabilidade do setor público. É difícil calcular precisamente quanto se gasta com a importação de equipamentos e material de consumo para a pesquisa acadêmica: pelo menos 312 instituições estão credenciadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para realizar compras externas diretamente, com isenção de pagamento de tributos, a partir de um sistema de cotas estabelecido anualmente. Além disso, não existem dados consolidados e disponíveis sobre as importações brasileiras para a pesquisa científica e tecnológica.

É possível fazer apenas estimativas a partir das operações de compras externas de algumas agências de fomento. O primeiro edital do CT-Infra I, um dos Fundos Setoriais administrados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), destina, por exemplo, R$ 149,3 milhões para apoiar 68 projetos de instalação e modernização da infra-estrutura de pesquisa em universidades e instituições públicas. Desse total, reservou R$ 80,5 milhões para compras de equipamentos para laboratórios, redes de informática, entre outros itens, dos quais 28%, ou seja, R$ 23 milhões, pagam produtos importados, segundo Fernando Ribeiro, diretor da Finep. Os gastos com obras no conjunto dos projetos somaram R$ 63 milhões, e as despesas de custeio e serviços gerais, mais R$ 5,7 milhões, sendo que, destes, R$ 4,1 milhões também estão relacionados à importação, pois incluem despesas alfandegárias, fretes, etc.

Já em São Paulo, os gastos da FAPESP com importações atingem, anualmente, algo em torno de 30% do orçamento. No ano passado, foram autorizadas importações no total de US$ 61,7 milhões, de um orçamento de US$ 171, 8 milhões. Em 2002 - a projeção é de um orçamento de US$ 165 milhões - foram autorizados gastos de US$ 34,4 milhões para importações de bens e serviços para projetos de pesquisa. Na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), com um orçamento de R$ 35 milhões neste ano, as importações representarão entre 30% e 40% do total de investimentos nos projetos de pesquisa, nos cálculos de Naftale Katz, diretor científico da instituição.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs) também consumia até 30% do seu orçamento nas compras externas de equipamentos e insumos de pesquisa, até que uma crise sem precedentes reduziu o orçamento de R$ 19 milhões para R$ 12 milhões, neste ano, paralisando os investimentos, tanto em reais como em dólares. A proporção de gastos em dólares é de 20% do orçamento da recém-inaugurada Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb), com um orçamento de R$ 21,5 milhões, em 2002. Há exceções. No Rio de Janeiro, os gastos em dólares representam em torno de 10% do orçamento, de R$ 50 milhões, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Faperj), segundo o diretor científico Luís Manoel Fernandes.

Feitas as contas, constata-se que as seis FAPs, com um orçamento total de US$ 199 milhões, investiram, neste ano, US$ 64,4 milhões, ou 32% de seu orçamento na compra de materiais, insumos e serviços importados. Essa amostra pode ser considerada significativa: as seis entre as 15 fundações brasileiras reúnem 69,4% dos grupos de pesquisa, segundo o Diretório Nacional de Grupos de Pesquisa do CNPq. Ainda assim é impossível projetar esse porcentual de gastos em dólares das FAPs ou do CI-Infra I para o conjunto da atividade de pesquisa no país, mas esses dados podem ser um bom indicador do grau de dependência externa da ciência brasileira.

 

Fonte:  Revista Pesquisa FAPESP, Edição 82 - Claudia Izique

 

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