Cursos de papel

 

O Ministério da Educação deve uma explicação à sociedade

Explodiu nos últimos dias o número de autorizações para o funcionamento de faculdades de direito no pais. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) acredita que se trata de “moeda de troca política”. De acordo com o levantamento da Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da entidade, o Ministério da Educação autorizou a criação de dois cursos, em média, por dia, nas últimas semanas. O presidente da OAB, Roberto Busato, protesta: “Ao que parece, está se repetindo agora nessa área a farra acontecida no Brasil também na reeleição de Fernando Henrique Cardoso, quando houve um grande estouro, um boom na criação desses cursos. Isso prova que o curso de bacharelando de direito é moeda de troca política, porque não é possível que haja tanta coincidência no aumento de autorizações para seu funcionamento, como está ocorrendo neste momento, às vésperas das eleições”. Tem razão Busato: o governo Lula repete o de seu antecessor. No de FHC, o número de autorizações do Ministério da Educação aumentou significativamente nas duas gestões. No fim de seu mandato, em 2002, o país contava com 599 cursos da área jurídica. No governo atual, já são 420 a mais, desde janeiro de 2003. Só no período do dia 4 deste mês até quinta-feira, o total de cursos saltou de 1.004 para 1.019. Sem dúvida, um absurdo e motivo de múltiplas ilações. Para o presidente da OAB, os números sempre mostraram acentuado crescimento no governo petista, mas, nos últimos dias, tem ocorrido uma expansão exagerada. 

O MEC deve uma explicação à sociedade. Esse festival de autorizações de cursos de direito cheira mesmo a troca de benesses em campanha eleitoral. Segundo a OAB, ganhou força na gestão do ministro Tarso Genro e agora recrudesce de forma extraordinária, a pouco mais de 40 dias do pleito de outubro; só entre os dias 4 e 10 deste mês, foram oito. A preocupação maior deve centrar-se na qualidade desses cursos que, com certeza, dificilmente se materializará, além de que, se persistir essa tendência de proliferação acelerada no número deles, a mudança de rumo só ocorrerá quando, na prática, tornarem-se economicamente inviáveis, o que – acredita Busato – não vai demorar muito. 

O Brasil, todos sabem, precisa dar atenção sistemática e redobrada à educação, em todos os níveis de ensino, mas não dessa forma. Não há mestres nem para sustentação de grande parte desses cursos, seja nos grandes centros e capitais ou em cidades de porte médio. Um dado salta da análise: já está havendo equiparação entre a quantidade de vagas e a de candidatos. Com isso, dispensa-se o vestibular para selecionar candidatos a esses cursos, de perfil faccioso e mercantilista, que não preparam ninguém no ramo das ciências jurídicas. O alerta da OAB procede, e é preocupante, e a sociedade brasileira precisa estar atenta a isso e boicotar as verdadeiras arapucas de ensino de direito que estão sendo frigidas país afora, com o beneplácito do MEC. Urge a nação saber quem são os donatários desses cursos, autorizados a toque de caixa pelo governo, sabe lá com quais intenções.
 

Fonte: Estado de Minas. Opinião. BH, 19/08/2006. Edtorial.


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