Melhores alunos do Enade não acertaram nem metade
da prova 
 

Exame repete falha do Provão: não estabelece meta para estudante, só compara instituições

Alunos de cursos que tiveram conceito máximo no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) não acertaram nem metade das questões da prova.

Levantamento feito pelo Estado mostra que há cursos de instituições públicas e conceituadas, como a Universidade Estadual Paulista (Unesp), que tiveram médias em torno de 45, numa escala de 0 a 100, e receberam conceito 5 no final, o mais alto.

Isso ocorre porque o Enade apenas ordena os melhores e os piores a partir do desempenho do grupo, sem determinar previamente a que nível o estudante deveria chegar para receber o maior conceito. O Provão, seu antecessor, tinha a mesma distorção.

Há cursos com conceito 5 no País, porém, que chegaram a 70% de acertos."Não adianta só mostrar quem é melhor do que quem, é preciso mostrar o que sabe cada um deles", diz o coordenador do Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Francisco Soares.

O especialista foi um dos consultores do Provão durante o governo Fernando Henrique Cardoso e afirma, no entanto, que essa metodologia é intrínseca às avaliações de ensino superior.

Para Reynaldo Fernandes, presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais do Ministério da Educação (Inep/MEC), responsável pela prova, é muito difícil definir critérios do que é bom ou ruim em cursos de graduação. "Quem vai dizer o que deve saber o estudante ao fim do curso?", questiona.

Segundo ele, isso é mais fácil de ser feito quando se trata do ensino básico. A Prova Brasil, por exemplo, que avalia alunos de escolas de todo o País da 4ª e da 8ª série, não apresenta a mesma distorção.

O Inep montou escalas que vão de 0 a 500 pontos. A cada nível que a criança chega é possível dizer o que ela sabe em português ou matemática, além de qual aquisição de conteúdo é esperada para alunos de cada série.

Descompromisso

Entre os cursos com conceito 5 no Enade, uma das mais baixas notas é a dos formandos de Engenharia de Telecomunicações da Universidade de Brasília (UnB): 42.

Também chamam a atenção os desempenhos dos cursos de Biologia da Universidade Federal de Alfenas e da Pontifícia Universidade Católica de Minas (PUC-MG), com 44,9 e 45,2 de médias. Apesar de o MEC dar notas de 1 a 5 para as instituições, as médias absolutas estão disponíveis na internet.

Para o educador Carlos Henrique Araújo, ex-presidente do Inep e secretário-executivo da ONG Missão Criança, as notas mostram que os estudantes estão mal preparados.

"Os alunos já chegam à universidade com déficit em todas as competências, não dá para resolver o problema lá", alega. "O Enade é o reflexo da falta de qualidade de toda a educação brasileira”.

Segundo o presidente do Inep, a metodologia também não permite determinar se o exame foi difícil demais para os estudantes, já que não há pré-teste das questões, como na Prova Brasil. Todos os ingressantes e concluintes selecionados por amostra pelo MEC fazem provas de conhecimentos gerais e específicos.

A primeira é igual para todos os cursos e, em 2005, questionou os alunos sobre reforma política e eleitoral, terrorismo, literatura, devastação da Amazônia, camada de ozônio. As questões gerais representam 25% da nota.

Para o presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Gustavo Petta, outro elemento pode contribuir para as baixas notas: o descrédito dos alunos com a avaliação.

"Eles acreditam que o exame não prova nada e não se esforçam para ter um bom desempenho. Os alunos de universidades públicas, que já têm nome, não acham que a instituição precisa da legitimação do Enade”. 

A melhor nota do País foi de Adriano Caribe Ribeiro, que cursava Matemática na Universidade Católica de Salvador e tirou 93,7.

O exame de 2005 foi feito por 277,4 mil estudantes de cerca de cinco mil cursos de graduação de Arquitetura e Urbanismo, Biologia, Ciências Sociais, Computação, Engenharias (distribuídas em 8 grupos), Filosofia, Física, Geografia, História, Letras, Matemática, Pedagogia e Química.
 

Fonte: O Estado de S. Paulo, 15/8/2006


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