Especialistas criticam modelo de financiamento do ensino superior

 
 

 

Seminário promovido pela Comissão de Educação e Cultura da Câmara, em parceria com o Sistema Confederação Nacional do Comércio (Sesc-Senac), aconteceu na segunda-feira [13]
 

No seminário internacional "Modelos de Financiamento para o Ensino Superior", realizado nesta segunda-feira na Câmara, as professoras Clarissa Baeta Neves, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e Elizabeth Balbachevsky, da Universidade de São Paulo, destacaram a necessidade de redefinir o modelo brasileiro.

De acordo com elas, a fórmula de distribuir recursos para as universidades públicas com base em dados como número de professores e de alunos está superada.

"Temos uma experiência muito rica de avaliação das instituições. Não há nenhum motivo pelo qual não se possa usar esses instrumentos para estabelecer formas de financiamento", destacou Balbachevsky. Na avaliação de Clarissa Neves, os debates durante o seminário deixaram claro que "não existe modelo ideal de financiamento".

Experiência asiática

O representante da Universidade de Hong Kong no seminário, Ka-Ho Mok, disse que a maioria dos países da Ásia oriental adotou a privatização do ensino superior para garantir a expansão do sistema.

A Malásia, por exemplo, teria praticado a política de convidar universidades de alto nível de outros países para atuar em seu território, com o objetivo de passar a ser um pólo de educação superior. "O objetivo é tornar a educação não apenas um bem público, mas transformá-la em uma commodity que pode ser muito útil no mercado", destacou.

Cingapura, segundo ele, também teria recorrido a essa estratégia; e até mesmo a China, que continua oficialmente socialista, estaria investindo nesse modelo. O governo chinês, de acordo com Ka-Ho Mok, concentrou os investimentos públicos em duas universidades para torná-las de nível mundial, uma em Pequim e outra nas imediações da capital. Isso foi necessário porque o país tem mais de mil instituições de ensino superior e não haveria recursos para financiar todas uniformemente.

Segundo o especialista chinês, a opção pelas estratégias de mercado permitiu, aos países asiáticos, aumentar rapidamente o número de estudantes de nível superior. Hoje, de acordo com ele, 88,5% dos jovens coreanos estão na faculdade. O índice é de 78,6% em Taiwan; de 54% no Japão; de 38% em Singapura; de 32,4% na Malásia e de 19,1% na China.

No entanto, o sistema também trouxe problemas. Dentre eles, Ka-Ho Mok destacou o aumento das desigualdades na educação, a ameaça à liberdade acadêmica e a pressão sobre as disciplinas menos orientadas para o mercado.

Professores defendem autonomia universitária com supervisão do Estado

Acadêmicos europeus afirmaram, na segunda-feira, que a autonomia crescente das universidades não deve desobrigar o Estado de suas responsabilidades em relação ao ensino superior.

Os professores Ben Jongbloed e Pedro Teixeira, respectivamente da Faculdade de Administração da Universidade de Twente (Holanda) e da Faculdade de Economia da Universidade do Porto (Portugal), traçaram um panorama dos modelos de financiamento do setor na Europa e disseram que os governos continuam com o papel de supervisionar e subsidiar o ensino superior.

Além disso, segundo eles, os governos devem estabelecer incentivos para a pesquisa e promover o acesso às universidades.

As afirmações foram feitas durante o seminário "Financiamento Superior: Uma Visão Comparada", promovido pela Comissão de Educação e Cultura em parceria com o Sistema Confederação Nacional do Comércio (Sesc-Senac).

Pedro Teixeira considera a autonomia gerencial das instituições públicas de ensino superior como um mecanismo para torná-las mais eficientes e aproximá-las da realidade socioeconômica. Nesse modelo, adotado por diversos países, as universidades seguem regras de mercado que estimulam a concorrência. O Estado deixa de ter o controle direto sobre elas para assumir o papel de supervisor. E o planejamento é descentralizado, com a tomada de decisões compartilhada pela instituição e pelos estudantes.

Por outro lado, o professor português explicou que, nesse tipo de gestão, os sistemas de avaliação passam a ter uma importância muito maior. "Quanto mais autonomia, mais concorrência, mais liberdade. Assim, é mais importante o papel do Estado no sentido de garantir a informação sobre a qualidade do ensino superior", reforçou Teixeira.

Falta de recursos

Pedro Teixeira lembrou que as mudanças no modelo de gestão das universidades foram deflagradas pela crescente falta de recursos do Estado para o financiamento dessas instituições. Já Ben Jongbloed defendeu a conjugação de recursos públicos e particulares no financiamento do ensino superior.

O holandês considera fundamental que o Estado mantenha os investimentos na área, mas adverte que o aumento do volume de recursos só será possível com a participação do capital privado.

Além da oferta direta do serviço em instituições particulares, o capital privado, segundo Jongbloed, pode financiar pesquisas. Na Europa, por exemplo, muitas universidades disputam verbas de fundos privados. As instituições elaboram projetos para captar esse dinheiro, tentando conjugar os programas de ensino e pesquisa com as demandas do mercado.

Jongbloed disse que, além dos recursos diretos captados no mercado, os países que adotam esse modelo premiam as universidades com bônus orçamentários. Ele explicou que, na Europa, há vários modelos de financiamento do ensino superior, e que as regras para aplicação do dinheiro são diferentes. Apesar disso, o governo ainda é responsável pelo financiamento de 2/3 do setor e o investimento médio fica entre 1% e 1,5% do PIB, apesar de a meta estabelecida para a Europa ser de 3%.

No Brasil, a Constituição determina que a União aplique anualmente 18% dos impostos no ensino em geral.

Financiamento social

O deputado Severiano Alves (PDT-BA) defendeu uma parceria entre o governo e as instituições privadas para expandir o ensino superior no Brasil. Nesse sistema, estudantes teriam a faculdade financiada pelo governo e, após formados, poderiam pagar a dívida prestando serviços para o Estado.

Assim, um médico com prazo de quatro anos para quitação da dívida poderia trabalhar durante quatro anos para o governo, atendendo à população, ou trabalhar dois anos e pagar o restante em dinheiro. "Seria um financiamento social para garantir o direito constitucional à educação", afirma Severiano Alves.

 

Fonte: Ag. Câmara, 13/10/08.

 


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