Falta conteúdo ao ensino no Brasil,
diz Unesco

 

Relatório sobre a situação da educação no mundo, divulgado ontem pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), situa o Brasil em 72.º lugar entre 127 países. É o segundo relatório deste tipo feito pela Unesco - do primeiro, o Brasil não participou, porque não enviou dados.

Ter posto quase todas as crianças de 7 a 14 anos na escola nos últimos anos continua rendendo elogios ao País. No entanto, os outros problemas da educação brasileira puxam o País para baixo no ranking. De acordo com o documento, intitulado Relatório de Monitoramento Global de Educação para Todos, ainda falta conteúdo de qualidade no ensino brasileiro.

A nota atribuída ao Brasil no Índice de Desenvolvimento Educacional (IDE), criado pela Unesco, é de 0,899, o que põe o País em uma posição considerada intermediária. O indicador é formado por quatro pontos - taxa de analfabetismo, matrículas no ensino fundamental, paridade entre meninos e meninas no acesso à escola e permanência na escola depois da 4.ª série primária.

A colocação brasileira no IDE é inferior à do Peru e do Equador, por exemplo. É justamente o indicador de permanência na escola, que avalia a qualidade do sistema de ensino, que derruba o Brasil no ranking.

Repetência
Enquanto ocupa a 32.ª posição na universalização do ensino fundamental, o País despenca para o 87.º lugar na permanência depois da 4ª série. "O Brasil teve grandes avanços nos indicadores, mas realmente ainda tem problemas de qualidade. Há uma repetência ainda muito alta que dificulta a permanência das crianças na escola", disse Christopher Colclough, diretor do grupo que preparou o relatório de monitoramento.

O Brasil é classificado pela Unesco entre aqueles países "ambiciosos", que estão em uma posição intermediária, mas fizeram compromissos e programas para ir adiante. No entanto, os programas elogiados como parte desse processo de inclusão já têm alguns anos. O relatório menciona o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef), criado em 1996, e o Bolsa Escola, de 2000. São programas que ajudaram na inclusão de crianças na escola, mas ainda não mexeram na qualidade do ensino.

O relatório aponta dados que podem explicar parte da falta de qualidade das escolas brasileiras. O Brasil, junto com Nicarágua e Suriname, é um dos únicos países da América Latina onde a educação obrigatória começa para os alunos apenas aos sete anos de idade. Na maioria dos países, inicia-se aos cinco e em alguns, aos seis. São dois anos de atraso. Boa parte dos demais países da região também leva a educação obrigatória pelo menos até os 15 anos, quando no Brasil ela termina aos 14.

O número de horas diárias de estudo no Brasil também não é suficiente. Pelos dados da Unesco, seriam necessárias entre 4h25 e 5 horas para as crianças realmente aprenderem. A média brasileira é de 4h15, mas em muitos Estados não chega nem mesmo a 4 horas. Nas escolas municipais de São Paulo, com três turnos, 4 horas é o máximo que se pode alcançar.

Discórdia
O governo brasileiro não gostou do que viu no relatório, mas o ministro da Educação, Tarso Genro, admitiu que esse resultado era esperado. "Esse resultado não é da história do atual governo nem do governo anterior, mas de sucessivos governos que não consideravam educação como essencial. Mas nos últimos anos o Brasil vem reagindo. E nós queremos que o nosso governo seja o marco que vai fazer essa virada", afirmou. Tarso disse ainda que o Brasil fez uma primeira revolução ao colocar todas as crianças na escola e agora vai fazer a segunda, de assegurar a qualidade.

Fonte: O Estado de S.Paulo, 9/11/04


Opiniões sobre os artigos ...


Coletânea de artigos


Home