EDUCAÇÃO AMBIENTAL 
Monsanto financia projeto que distribui material didático 

Líder do mercado de transgênicos no Brasil firmou acordo com editora para distribuição
de material didático e publicações sobre agricultura e meio ambiente em escolas
públicas. Parceria preocupa educadores, mas editora nega que haja
propaganda da empresa ou de transgênicos.
  

A Monsanto firmou uma parceria com a editora Horizonte Geográfico para a distribuição de material didático e de publicações sobre agricultura e meio ambiente nas escolas públicas brasileiras. Apresentada como parte do projeto de responsabilidade social da empresa, a iniciativa já provocou reações de parlamentares e de organizações da sociedade civil que enxergam nela uma forma de propaganda dos produtos transgênicos da empresa. No Rio Grande do Sul, o deputado estadual Frei Sérgio Görgen (PT) denunciou com veemência o projeto da empresa, lamentando o fato de que ele conte com o apoio do Ministério da Cultura, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura. “Esta empresa, além de incentivar o contrabando de soja transgênica no Brasil, fazer lobby para a aprovação da Lei de Biossegurança e cobrar caro pelo uso das sementes, agora investe pesado na lavagem cerebral de milhares de crianças”, criticou. A editora rejeitou a acusação. 
Segundo a empresa, todos os alunos de 5ª à 8ª séries, de 5.049 escolas da rede pública estadual da Bahia, Mato Grosso, Goiás, Rio Grande do Sul e Distrito Federal, além de 500 educadores do ensino fundamental estão recebendo “informações, material de apoio e cursos sobre dois dos assuntos de maior destaque da atualidade: agricultura e ambiente”. O projeto “O grão que conquistou o Brasil” é uma das propostas para serem debatidas em sala de aula. O deputado Frei Sérgio fez um apelo aos professores e professoras da rede pública para que fiquem alertas ao significado do projeto da Monsanto, estudando o tema dos transgênicos e se preparando para “resistir a essa invasão da empresa nas salas de aula”. Além disso, considerou inadmissível o apoio do governo federal a um projeto desta natureza, convocando uma campanha de e-mails para o Ministério da Cultura, denunciando o teor da parceria. 

“Janela para o Mundo”

A página da Monsanto na internet (www.monsanto.com.br) detalha os objetivos do Projeto “Janela para o Mundo”, destacando a parceria firmada com o Ministério da Cultura. Segundo Cristina Rappa, gerente de Comunicação da Monsanto do Brasil, a empresa escolheu “o tema agricultura e, por extensão, ambiente, não só por estarem vinculados ao nosso negócio, mas, também, pela importância que esses assuntos têm para o futuro do País e do mundo”. “Nos últimos anos”, acrescentou Rappa, “temos ouvido tanto no Brasil sobre o agronegócio, mas, muitas pessoas, principalmente as que vivem nos centros urbanos, desconhecem como são produzidos os alimentos, as principais culturas produzidas no Brasil, etc.”. Lúcio Mocsányi, diretor de comunicação da empresa, diz que a idéia do projeto “foi especialmente atrativa para a empresa, que prioriza iniciativas ligadas à educação”. 
Segundo o executivo, a Monsanto investiu, nos últimos três anos, cerca de US$ 45 milhões em projetos comunitários nos países onde atua. No Brasil, diz Mocsányi, nos últimos quatro anos foram mais de US$ 600 mil/ano em dezenas de programas implantados em diversos municípios brasileiros. Entre eles, citou o “Cidadão Mirim”, implementado em 2003, em Camaçari (BA), onde fica uma das fábricas da empresa no país, um projeto que “leva a jovens e crianças de comunidades carentes noções de cidadania e higiene, educação ambiental, informações sobre sexualidade e outros temas relacionados à saúde”. A Monsanto também patrocina o projeto “Afro-brasileiro”, em parceria com o Centro de Integração Empresa-Escola, que subsidia a formação universitária de estudantes negros de baixa renda, através de uma bolsa de R$ 400 mensais para a compra de material didático, transporte e alimentação e mais R$ 100 para cursos complementares. 

Preocupação de educadores

A Rede Brasileira de Educação Ambiental (Rebea) iniciou uma campanha através de sua página na internet (http://www.rebea.org.br) convocando educadores e ambientalistas a enviarem cartas e mensagens eletrônicas para a revista Horizonte Geográfico, para o órgão gestor da Política Nacional de Educação Ambiental e para o Ministério da Educação (MEC), solicitando uma avaliação do projeto “Janelas para o Mundo” e a suspensão de suas atividades até o resultado da avaliação. Segundo Vivianne Amaral, da Rebea, é preciso ter regras claras em relação a iniciativas de empresas e de organizações não-governamentais em escolas públicas no que diz respeito à execução de projetos de educação ambiental, distribuição de material para-didático e formação de alunos e professores. O projeto em parceria com a Monsanto está distribuindo um total de 11 mil kits educativos. 
Os kits são compostos de dois exemplares de um pôster sobre Culturas da Terra no Brasil, um mapa que identifica o uso da terra no país e diferentes sistemas agrícolas, um guia de atividades para uso dos professores e uma carta-pesquisa. As mil primeiras escolas que responderem a pesquisa receberão uma caixa da empresa com uma coleção de oito sementes e material informativo. Além disso, educadores do ensino fundamental estão participando de oficinas, com oito horas de duração, ministradas por professores especializados, em locais definidos pelas secretarias de ensino dos estados. A Rebea teme que, através deste projeto, esteja sendo adotado “um elemento cultural estranho ao processo educativo regulado através de princípios e políticas públicas, sem que os setores governamentais dedicados ao tema sejam ouvidos”, especialmente por envolver a Monsanto, uma empresa que “está no centro de preocupante debate que envolve a saúde humana”. 

A posição da editora

O diretor geral da Editora Horizontes Geográficos, Peter Milko, rechaçou as afirmações de que o projeto estaria sendo utilizado pela Monsanto para fazer propaganda de seus produtos transgênicos nas salas de aula. “Em nenhum texto é mencionado o patrocinador ou algum produto ou tecnologia desenvolvida por ele”, assegurou Milko, em nota divulgada no dia 15 de abril. Segundo ele, a Monsanto aceitou, em 2005, a proposta da editora para investir no projeto. Através da Lei Federal de Incentivo à Cultura, a empresa terá uma isenção fiscal de 30% sobre o valor de R$ 480 mil investidos, revelou ainda. O papel do patrocinador, segundo Milko, é fornecer recursos financeiros próprios, ou através da Lei Rouanet, para viabilizar a ação educativa promovida pela editora. “Várias empresas patrocinaram outras etapas do Janela para o Mundo, e os resultados foram reconhecidos positivamente pelo poder público e por prêmios da iniciativa privada”, concluiu.

Fonte: Ag. Carta Maior, Marco Aurélio Weissheimer, Porto Alegre, 26/04/2005.