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Museu vivo do Código Penal

 

Acredite: 22% dos parlamentares estão sob suspeita de ter cometido algum crime – numa lista que inclui seqüestro, extorsão, estelionato...

Em vinte anos de democracia, o Brasil sempre conviveu com algum escândalo no Congresso Nacional. Já se flagraram casos de má conduta individual, como o dos pianistas, que votavam em nome do colega, ou de parlamentares suspeitos de cobrar propina para favorecer um suspeito em investigações de CPI. Já houve, também, casos de delinqüência coletiva, como o célebre assalto da máfia dos anões ao Orçamento da União, que resultou na cassação de seis parlamentares, ou a violação do painel eletrônico do Senado, que mandou dois senadores de volta para casa. A atual safra de deputados e senadores, que partem agora para tentar se reeleger (ou não) nas eleições de outubro próximo, bateu todos os recordes e superou as piores expectativas – das propinas cobradas por Severino Cavalcanti à máfia dos sanguessugas ou à turba dos mensaleiros. Na semana passada, um levantamento de VEJA descobriu que, entre os 594 parlamentares, nada menos que 130 estão sob investigação por suspeita de ter cometido uma gama de mais de vinte crimes. Ou seja: a nuvem da suspeita cobre hoje 22% do Congresso.

O plantel de suspeitos representa um volume enorme, mas, na prática, é ainda maior que isso. O levantamento de VEJA inclui apenas os parlamentares cujos supostos crimes já tenham sido tipificados – seja ainda na fase de investigações do Ministério Público, seja na etapa de denúncia ao Supremo Tribunal Federal. Os 94 deputados e senadores da lista atual (veja a relação completa) respondem a 154 processos. São oitenta deputados e catorze senadores de todos os partidos. Com esse critério, VEJA não incluiu, portanto, o nome de 57 parlamentares que estão sendo investigados pelo Ministério Público sob suspeita de envolvimento com a máfia dos sanguessugas porque, como o caso corre sob sigilo judicial, não há informações precisas acerca da identidade de cada um deles nem dos crimes dos quais são suspeitos. Na semana passada, a revista conseguiu apurar o nome de 44 dos 57 parlamentares investigados, mas não descobriu seus supostos crimes. Considerando que, desses 44 sanguessugas, oito já estão na lista pública de VEJA, pode-se concluir que hoje – pelo menos – 130 parlamentares estão sob investigação.

"São dados assustadores. A delinqüência está cada vez mais generalizada no Congresso", resume o professor David Fleischer, do departamento de ciência política da Universidade de Brasília (UnB). O cenário não choca apenas pela quantidade de suspeitos, mas também pela qualidade dos crimes. Na lista, há crimes que costumam aparecer na biografia de bandidos comuns, como estelionato, seqüestro, extorsão, formação de quadrilha. Isso acontece porque o instituto da imunidade parlamentar, que surgiu no século XVII com o objetivo de garantir a liberdade de opinião e voto dos parlamentares sob a monarquia inglesa, foi inteiramente desfigurado sob o ar dos trópicos. Aqui, a imunidade parlamentar, que dá uma série de privilégios legais ao deputado ou senador, em vez de ficar restrita à palavra e ao voto, que são instrumentos essenciais no desempenho da função parlamentar, foi ampliada para crimes comuns – como estelionato, seqüestro, extorsão, formação de quadrilha. Isso explica um fenômeno bem brasileiro: o excesso de bandidos concorrendo a uma cadeira de parlamentar na eleição.

O quadro fica ainda mais grave quando a imunidade parlamentar se associa ao uso abusivo de outra prerrogativa – o foro privilegiado, pelo qual os deputados e senadores acusados de qualquer crime, até mesmo um homicídio, só podem ser julgados pelo Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte judiciária do país. O problema é que, até hoje, o STF jamais condenou um único parlamentar. Os processos, sem exceção, acabaram arquivados ou os réus foram inocentados. Naturalmente, um processo sempre pode resultar na absolvição do réu, mas é improvável que todos os processos que não foram arquivados tenham – com justiça – terminado por decretar a inocência do acusado. "O STF é uma corte conservadora e sem estrutura para lidar com matéria penal", diz o sociólogo Luiz Werneck Vianna, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), ao externar uma interpretação com a qual concordam os próprios ministros do STF. Cientes dessa realidade, os políticos com algum problema na Justiça fazem de tudo para manter o mandato. E quem não tem mandato faz de tudo para ganhar um. É o caso, agora, do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, acusado de violar o sigilo bancário do caseiro que foi testemunha de seus encontros em uma casa em Brasília com a turminha da pesada formada durante sua passagem pela prefeitura de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Ou do ex-prefeito paulistano Paulo Maluf, dono de contas secretas no exterior com dezenas de milhões de dólares.

 

O QUE É CADA CRIME

 

FORMAÇÃO DE QUADRILHA

É a associação de quatro ou mais pessoas para cometer um crime    

PECULATO

É quando um servidor público se vale do cargo para apropriar-se de dinheiro ou bem de outra pessoa    

APROPRIAÇÃO INDÉBITA

É o crime de quem se apropria de um bem alheio sem o consentimento do dono    

CRIME MILITAR

É o ato considerado ilegal dentro da caserna, que pode variar de insubordinação à deserção    

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

É o crime que o agente público comete quando desvia verba pública, frauda licitação ou usa o cargo em benefício próprio ou de outrem  

CRIME DE RESPONSABILIDADE

É a sanção aplicada ao agente público – presidente, ministros, governadores – que viola as funções de seu cargo  

CORRUPÇÃO ATIVA

É o crime de oferecer uma vantagem indevida a um funcionário público    

CORRUPÇÃO PASSIVA

É quando o funcionário público aceita vantagem indevida em razão da função que ocupa  

CRIME DE ESCRAVIDÃO

É manter trabalhadores em condições de trabalho análogas à de escravidão    

CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO

Engloba crimes como a evasão de divisas e emissão falsa de moedas ou títulos    

LAVAGEM DE DINHEIRO

É a dissimulação de recursos de origem ilícita com o objetivo de realocá-los no sistema financeiro  

DECLARAÇÃO FALSA DE IMPOSTO DE RENDA

É o crime de prestar informações inverídicas à Receita Federal  

CRIME DE ABORTO

É quando se interrompe uma gravidez de forma proposital fora dos casos previstos em lei    

CRIME ELEITORAL

São os atos irregulares cometidos durante o pleito, que vão desde boca-de-urna indevida até a compra de votos    

EXTORSÃO

É o crime de constranger alguém para obter uma vantagem econômica indevida    

SONEGAÇÃO FISCAL

É quando o contribuinte burla o pagamento de impostos ao Fisco    

FALSIDADE IDEOLÓGICA

É o ato de omitir a verdadeira identidade, fraudar uma assinatura, usar um documento falso    

CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Contempla uma gama de crimes cometidos por servidores públicos, como peculato, corrupção e concussão    

GESTÃO FRAUDULENTA DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA

É a denominação genérica de atos ilícitos cometidos à frente de bancos ou operadoras de câmbio    

SEQÜESTRO

É o crime de manter outra pessoa em cárcere privado contra a vontade dela    

CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA

Designa atos ilícitos contra o Fisco, como fazer declarações falsas ou omitir informações tributárias  

ESTELIONATO

É o crime de obter vantagem indevida ao induzir alguém a um erro    

CRIME AMBIENTAL

É toda ação irregular que afete o meio ambiente, como desmatamento e extração ilegal de recursos naturais    

PREVARICAÇÃO

É quando o servidor público deixa de cumprir atos que a obrigação funcional lhe impõe    

LESÃO CORPORAL

É o crime de agredir outra pessoa ou ofender sua integridade física 

CRIME CONTRA O CONSUMIDOR

Contempla uma gama de crimes tais como omitir o perigo de um produto ou dar informações enganosas    

CONCUSSÃO

É quando o funcionário público exige, em razão do cargo que ocupa, vantagem de outra pessoa

 

Fonte: Rev. Veja, Diego Escosteguy, ed. 1964, 12/07/2006.


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