Patrulhamento universitário
Ives Gandra Martins*

 

Gosto do ministro Tarso Genro e de Fernando Haddad. Não gosto da forma como estão reduzindo a qualidade do ensino universitário, à luz de um incorreto conceito de democratização da educação e da cultura, mediante a substituição do "mérito" pelo "assistencialismo".

A título de colocar carentes, índios e negros na Universidade - sem necessidade de prestar os rígidos vestibulares exigidos pelas instituições - retiraram a oportunidade de 10% de alunos que poderiam entrar por mérito nos estabelecimentos e o seu direito, antes assegurado, de lá ingressar, para permitir que pessoas, sem o mesmo preparo, cursem escolas superiores. É de se lembrar que o governo federal não tem ainda elaborado um plano coerente para permitir que tais pessoas adquiram, no ensino fundamental e no 2º grau, o mesmo nível de educação e cultura das que freqüentam as escolas particulares.

Em troca de vagas confiscadas às universidades privadas - obrigadas a aderir ao PROUNI para evitar retaliações - oferece a muitas delas, que se organizaram como entidades beneficentes de assistência social, rigorosamente nada, visto que já gozam de "imunidade constitucional de tributos". Em relação a estas entidades, existe uma vedação absoluta ao poder de tributar e, se o governo está, constitucionalmente, proibido de tributar, não está ofertando nada em troca das vagas de que pretende apossar-se. É puro confisco.

Com o projeto de lei de diretrizes e bases, que pretende apresentar ao Legislativo, retira, por inteiro, a autonomia das escolas superiores, garantida pelo artigo 207 da Constituição, substituindo o "mérito acadêmico" pelo "patrulhamento governamental" e "a liberdade de ensino" pelas "preferências ideológicas dos ocupantes do poder". Isso porque, nos conselhos consultivos haverá uma menor participação dos mantenedores, e dois pré-reitores escolhidos, um deles pela comunidade acadêmica e outro pela "sociedade democrática"!!!

A universidade, que é nitidamente uma instituição de pesquisa e aprofundamento do ensino maior, na visão dos ideólogos do Ministério da Educação, deverá ser orientada pelos humores e pelas opiniões não acadêmicas da sociedade civil, representada por membros escolhidos pelo poder público, entre eles sindicalistas, alunos e funcionários, além de pessoas integrantes de ONGs que contem com a simpatia governamental. Os mantenedores, que hoje detêm 100% do controle de tais entidades, ficariam reduzidos a 20% de participação, apesar de permanecerem 100% responsáveis no plano tributário, trabalhista, civil, sempre que o conselho consultivo impuser diretrizes onerosas, com o respaldo do MEC. Já se vê que tal órgão terá fantástico poder de pressão.

Estou convencido que há todo um setor do governo Lula interessado em controlar a informação, a formação, a educação, e a cultura - técnica adotada por Stálin e pelos países vinculados à URSS. A sociedade já rejeitou o Conselho Federal de Jornalismo para evitar a pré-censura, já rejeitou a ANCINAV, que objetivava controlar a produção cultura e artística, não tendo, todavia, conseguido impedir o financiamento oficial aos invasores de terra e violadores da Constituição, representados pelo MST, nem a "politização" das agências reguladoras.

Se, todavia, não rejeitar o "patrulhamento ideológico" que o governo pretende impor à universidade, pelo anteprojeto apresentado, na parte maior e mais nobre da preparação cultural e científica de nosso povo, que é o ensino superior, o país conhecerá uma degradação do ensino sem precedentes, pela substituição do "mérito acadêmico" pela "preferência ideológica" e "da evolução do ensino" pela "garantia da mediocridade dos amigos do rei".

Se o presidente Lula não perceber que as derrotas em Porto Alegre, São Paulo e na Câmara dos Deputados sinalizam que o povo brasileiro já se deu conta de que está em curso uma tentativa de controle absoluto da sociedade, poderá vir a amargar fantástica derrota, no pleito de 2006, como ocorreu no passado, quando, à guisa de projeto de governo, defendia medidas semelhantes às que agora pretende implantar. Até agora, parece não ter compreendido que a única parte que funciona no seu governo não é ideológica (a economia) e que os setores que não funcionam são capitaneados pelos vencidos nas eleições de 2002, que teimam em tomar como modelos de poder Cuba e Venezuela.

Se Lula refletir que o PT teve apenas 30% dos votos em 2002 e ele, pessoalmente, 60%, talvez entenda que está na hora de dizer, de uma vez por todas, um basta aos amigos do ditador genocida Fidel Castro, e começar a governar para o país e não para o PT.

Quando operou recentemente seu nariz, não buscou os médicos cubanos - a quem a ala ideológica do partido está preocupada em assegurar livre exercício profissional em nosso país, sem as condições exigidas dos que se formam em outros países - mas médicos formados no Brasil, antes do "patrulhamento universitário".

* Advogado. Especialista em Direito Tributário e Ciências das Finanças pela Universidade de São Paulo - USP. Doutor pela Universidade Mackenzie, Professor Titular de Direito Econômico e Direito Constitucional da Universidade Mackenzie, foi Conselheiro da Ordem dos Advogados de S. Paulo OAB/SP, e professor Emérito da Universidade Mackienze, da Universidade Paulista e da ECEME (1994).

Fonte: Jornal do Brasil, 24/02/2005.


Opiniões sobre os artigos ...


Coletânea de artigos


Home