PPP: O CAPITALISMO SEM RISCO
NOTA PÚBLICA(*) 

 

O projeto de lei encaminhado pelo Executivo ao Congresso Nacional sobre as PPPs (Parcerias Público-Privado), que está em tramitação no Senado Federal, tem sido apresentado pelo governo como a verdadeira salvação nacional, capaz de gerar crescimento econômico, empregos e de alavancar investimentos, sem custo para o Estado. Porém, vale  ressaltar que o projeto é apoiado pelas instituições financeiras multilaterais como o Banco  Mundial (BM), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Fundo Monetário  Internacional (FMI) e serve de diretriz para inúmeros países em desenvolvimento. Este instrumento, nos países onde foram implantados, trouxe mais problemas que soluções e não  teve o efeito "positivo" alardeado pelos seus defensores. 

Um primeiro aspecto, que vale ressaltar, diz respeito ao fato do projeto de lei das PPPs ter  sido pouco discutido, tanto com os setores organizados da sociedade civil, como com os  setores políticos representados no Congresso Nacional. Não houve debates amplos e públicos sobre o tema, já que o projeto apresenta sérios riscos para o interesse público e  compromete, apesar do governo negar, recursos públicos. Na verdade o PPP é uma forma  de privatização de setores e serviços públicos estratégicos. Criaram um novo nome para  uma coisa antiga e conhecida de todos. 

No projeto, o Estado Brasileiro assume todos os riscos do negócio (se não der certo o  governo paga), permitindo e garantindo aumento de tarifas, a emissão de títulos do Tesouro  e a entrega do patrimônio público como garantia para os investimentos do setor privado. Desconsidera completamente o Código de Defesa do Consumidor, assim como as leis  ambientais, atribuindo todas as garantias para o setor privado receber o pagamento pelos  serviços prestados.  

Trata-se de um cheque em branco para os poderes executivos nos três níveis de governo,  pois tudo passará a depender dos contratos assinados. Não há delimitação das áreas ou tipos  de serviços. O governo federal, os governos estaduais e municipais poderão combinar privatizações, concessões e contratação de obras em qualquer área sem aprovação prévia,  seja do Congresso Nacional, das assembléias estaduais ou das câmaras municipais. O projeto retira, na prática, poderes dos órgãos de fiscalização, tais como Ministério Público,  Poder Judiciário, Tribunais de Contas e Legislativo, pois o que prevalece são os contratos  assinados, sem previsão de nenhum tipo de fiscalização.  

A Lei das Licitações, por exemplo, deixará de ser aplicada em vários aspectos. As PPPs  permitem uma combinação de proposta técnica e econômica. Este modelo estimula a  corrupção, pois se pode alegar sempre que a proposta mais cara é também a melhor. Se com  a Lei de Licitações já existe corrupção, imagine com a proliferação de contratos de PPP no  mais de cinco mil e quinhentos municípios brasileiros. 

Uma visita ao site eletrônico do Tribunal de Contas da União (TCU) pode nos dar a  dimensão do que está por vir. Gostaríamos de alertar que o projeto de lei não prevê nenhum  tipo de controle social sobre as PPPs.  

Outro aspecto preocupente do projeto de lei das PPPs e que facilita a corrupção é a figura  da arbitragem à margem do Poder Judiciário. Nem sequer se está assegurando que o foro da arbitragem será nacional. Com a lei das  PPPs, a arbitragem internacional fica legalizada.  

Mais estranho, ainda, é o próprio Poder Executivo definir o quanto poderá endividar-se. No caso da União, não existem limites para o endividamento porque o Senado Federal, pelo  projeto de lei, não precisará aprovar nenhuma resolução a respeito. As PPPs permitem contrair grande volume de dívidas que podem ser liquidadas em até 45 anos. Isto além de  agravar o problema do endividamento, comprometendo as finanças futuras, coloca em risco  a soberania do país. As PPPs comprometem os mandatos dos governantes futuros e violam os princípios mais caros à responsabilidade fiscal. 

Outro aspecto do projeto de lei é que não é verdade que o financiamento para os PPPs será privado, como tem argumentado o Governo. O projeto permite que a maior parte seja  financiamento público. Segundo o governo, a previsão de recursos extra-orçamentários do  Plano Plurianual é de R$ 274 bilhões, o que significa 14,7% do PPA, até 2007.  Provavelmente estes recursos servirão para financiar as PPPs. O pior é que o Poder  Legislativo não opina sobre a alocação de recursos extra-orçamentários, nem tem a  possibilidade de monitorar sua execução, pois não consta do Sistema Administrativo  Financeiro (SIAFI). Se no Governo FHC os recursos públicos foram usados para financiar  as privatizações, no Governo Lula servirá para financiar as PPPs. 

Ainda há tempo para rejeitar o projeto. O INESC ciente dos prejuízos que este projeto  poderá trazer para todos, solicita aos parlamentares que votem contra o projeto de lei, pois  ele contribui apenas para concentrar riqueza, enfraquecendo o Estado, e não contribui para  o desenvolvimento do país com distribuição de riquezas. 

O projeto de lei Parceria Público Privado, ao contrário do que se podia esperar de um  governo que se elegeu com a critica ao que se denomina "neoliberalismo", significa o  "Capitalismo sem risco" para os empresários, colocando o Estado, que deve ser um ente  público, a serviço dos interesses privados e dando todas as garantias aos donos do dinheiro.  Caso algo dê errado, o Estado assume o risco. Só faltou dizer quem paga a conta. Com  certeza, serão os que sempre pagaram nestes quinhentos anos de Brasil: o cidadão comum. 

 

(*) Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC  -   Site: http://www.inesc.org.br 

Fonte: INESC, 02/06/2004.


Opiniões sobre os artigos ...


Coletânea de artigos


Home