Reforma universitária domina debates
na abertura da 60ª SBPC

 

 

"Precisamos de uma educação de qualidade em que o conhecimento se transforme em benefício econômico e desenvolvimento social. A consolidação do sistema de ciência e tecnologia nas últimas seis décadas, ainda não se converteu em inclusão social. Queremos uma revolução educacional em larga escala. O desenvolvimento sustentável e a economia do conhecimento são os pilares de um país que pretende encarar o desafio de uma educação de qualidade massificada." A afirmação partiu do presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Marco Antonio Raupp, diante das cerca de mil pessoas, entre pesquisadores e autoridades governamentais de todo o país, que assistiam a cerimônia de abertura da 60ª Reunião Anual da SBPC, neste domingo, 13 de julho, no Centro de Convenções da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em São Paulo. Entre os presentes, estava o diretor científico da FAPERJ, Jerson Lima Silva, no ato, representando a presidência da Fundação. Lima Silva ainda apresentou uma palestra sobre a Química Biológica na terça-feira, 15 de julho. 

Na mesa de abertura da solenidade, que contou com a presença de diversas autoridades e representantes da pesquisa no país, Raupp ainda declarou que "a SBPC está aberta às discussões sobre novos caminhos, idéias e mecanismos que acelerem essa revolução educacional." Ele enfatizou também a necessidade de uma atualização permanente da legislação e de políticas públicas como forma de abrir caminhos para ao desenvolvimento do país. Endossando as palavras de Raupp, o presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (Capes), Jorge de Almeida Guimarães, também falou sobre a reforma universitária. “É essencial a presença de um número maior jovens na universidade. Para isso, precisamos não só do apoio das instituições de pesquisa, mas também de todo o movimento estudantil, para a criação de um sistema universitário mais inclusivo.” 

Jorge Guimarães reforçou ainda que a pesquisa desenvolvida pelas diversas instituições deve ter o objetivo primordial de se converter em projetos que melhorem a qualidade de vida da população. Ele chamou a atenção para a necessidade primordial de se estabelecer uma política de desenvolvimento sustentável para a Amazônia. “Os pesquisadores e centros de pesquisa têm o dever de lutar pela transferência de conhecimento científico e de um modelo de uso racional dos recursos naturais da região”, completou. 

Também presente, o ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Machado Rezende, chamou a atenção para a competência da SBPC como elemento político responsável pelo desenvolvimento do sistema de pesquisa brasileiro ao longo de seus sessenta anos de existência. Ele salientou o forte papel de fórum de discussões da entidade. "A SBPC foi fundamental para o desenvolvimento científico que temos hoje no país. Graças à sua atuação, um importante órgão como a Capes (Coordenação de Avaliação de Pessoal de Nível Superior) – órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia, responsável pela qualidade de ensino nas universidades e pós-graduações do país – foi criado nos anos 1950", afirmou o ministro. "Além disso, nos anos 1970, a SBPC ficou conhecida como palco de discussões sobre os mais variados temas, numa época em que era perigoso discutir determinados assuntos no país", acrescentou. 

O reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge, foi outro que destacou o avanço da C&T nos últimos anos e a importância do papel da SBPC. "Em julho de 1949, pouco mais de 150 pesquisadores se reuniam no auditório do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) para a 1ª Reunião Anual da SBPC. Hoje, passados 60 anos de sua fundação, a reunião volta a Campinas, com uma estimativa de 15 mil participantes, ou seja, um número cem vezes maior. O que é prova inequívoca do crescimento da ciência e tecnologia no país", afirmou. 

Parceria histórica entre SBPC e UNE foi lembrada na cerimônia 

A cerimônia foi aberta pela Orquestra de Trompetes da Unicamp, que tocou músicas populares brasileiras. Em seguida, a exibição de cenas de um documentário mostrou o papel da SBPC como um dos únicos fóruns de debates durante o período militar brasileiro. Neste momento, um grupo de universitários da Unicamp subiu ao palco com uma faixa de protesto contra o uso de animas em pesquisas científicas. Todos os presentes na mesa de abertura da solenidade chamaram a atenção para a legitimidade que a democracia vigente concede hoje aos protestos. 

Os estudantes foram representados na solenidade pela presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Lúcia Stumpf, e o presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), Hugo Valladares. As propostas do movimento estudantil e das instituições de pesquisa se mostraram em sintonia com relação à reforma universitária. Lúcia inclusive lembrou a longa tradição histórica de unidade e parceria da SBPC e da UNE ao longo desses 60 anos. "Professores, pesquisadores, sociedade e estudantes devem se unir por esta causa: a ampliação da universidade. Precisamos que este espaço inclua um maior número de jovens. E precisamos igualmente evitar o atual processo de compra de universidades particulares por grupos estrangeiros sem nenhum interesse na nacionalização da pesquisa em nosso país", concluiu. 

Adolescentes, universitários, pesquisadores e autoridades: propostas comuns 

“A população precisa conhecer mais a ciência. Só assim os brasileiros terão consciência da importância de suas atitudes. Desta maneira, poderemos, em nosso dia-a-dia com nossa família, evitar o consumo excessivo de bens supérfluos e poluentes. E poderemos buscar formas de energia mais sustentáveis e que tragam menos prejuízo ao meio ambiente.” A afirmação bem poderia ser do Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc – que debateu a questão ambiental no primeiro dia aberto ao público, segunda-feira, 14 de julho. Ou mesmo de alguma autoridade presente à cerimônia de abertura, como o presidente da SBPC, Marco Antônio Raupp. Com certeza, também encontraria respaldo na voz da ganhadora do prêmio José Reis de Divulgação Científica, a jornalista Alícia Ivanissevich, que também debateu o acesso à divulgação científica e concluiu: "É preciso investir na comunicação direcionada aos jovens, que são o futuro do país." A afirmativa – que, na verdade, é de Gabriel Augusto Leite e mais sete colegas da oitava série do ensino fundamental da escola Mope, em São José dos Campos, interior paulista – mostrou-se um exemplo de como as propostas e discursos apresentaram alguns eixos comuns. 

"Eles se mostraram extremamente empolgados em participar pela primeira vez da SBPC Jovem com o estudo sobre aquecimento global que  fizeram”, conta Carlos Alexandre Wuensch, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e professor de Astronomia, parte da disciplina de Ciências naquela escola. Wuensch ainda destacou a alfabetização científica – leitura crítica dos conteúdos relacionados à ciência, divulgados pela mídia, mas desconhecidos de grande parte da população, como a discussão sobre células-tronco, desenvolvimento sustentável, políticas voltadas para a Amazônia, entre outros temas atuais. 

A questão ambiental também motivou outros estudantes. Os universitários da Faculdade de Educação da Universidade Estadual do Amazonas (UEA), Gabriel Nascimento, Maria Aleluia Cardoso e Carlos Alberto Rocha – os dois últimos, deficientes visuais – também exploraram o tema no pôster que apresentaram. “Temos ajudado há um ano o projeto Casa da Física, em que universitários voluntários realizam experimentos científicos que servem de reforço escolar para alunos de escolas públicas da capital do Amazonas”, explica Rocha. “Esta é a primeira vez que participamos da SBPC. Espero que consigamos levar nosso projeto até o interior do Amazonas e que na próxima edição do evento – que acontecerá em julho de 2009, em Manaus – possamos mostrar um estado bem forte na área de C&T”, acrescenta Maria Aleluia. “De uns três anos para cá, com a reestruturação da Fapeam (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas) os investimentos nesta área têm aumentado consideravelmente”, encerra Nascimento. 

Para o público, a 60ª Reunião Anual da SBPC foi aberta nesta segunda-feira, dia 14 de julho. Sob o tema central "Energia, meio ambiente e tecnologia", subdividido em 17 núcleos temáticos, haverá mais de 300 atividades, entre conferências, simpósios, mesas-redondas, minicursos, apresentações de pôsteres, encontros de sociedades científicas, assembléias e sessões especiais. Outras 200 atividades estão direcionadas a estudantes na SBPC Jovem, enquanto artistas da região apresentarão algumas das manifestações da cultura local na programação da SBPC Cultural. Até esta sexta-feira, 18 de julho, o campus da universidade estará movimentado com os estandes da Expo T&C – de instituições de ciência e tecnologia, incluindo a FAPERJ –, uma feira de livros e outra de artesanato. Estão ainda programadas sessões diversas para debater os 60 anos da SBPC, o centenário da emigração japonesa e o ano internacional da Terra, entre outros temas.

 

Fonte: Boletim da FAPERJ, Vinicius Zepeda, 17/7/2008.

 


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