Retrocesso à vista na Educação 

  

O atual ministro, Fernando Haddad, além de petista, está dando conta da menina dos
seus olhos no setor: o apregoado pacote que prevê mais do que dobrar o
total de vagas nas universidades federais

O noticiário político de ontem atribui ao presidente Lula a queixa de que, se dependesse só dele, o critério de escolha dos ministros do segundo governo seria técnico, porque “políticos dão muito trabalho”.

Por mais que se saiba que trabalho não é propriamente a praia do presidente e por menos respeitável que seja o motivo por ele invocado para preferir técnicos a políticos no comando da administração federal, do que se dá como certo ou muito provável na formação do novo Gabinete se chega sem trabalho algum à conclusão de que o queixume é falso como uma nota de 3 reais.

É verdade que, nas democracias, não depende só do governante a escolha da sua equipe.

No presidencialismo brasileiro, então, freqüentemente o máximo que o titular no Executivo pode nesse processo - e pensa duas vezes antes de fazê-lo - é pedir a um partido da sua coalizão que apresente outro nome para determinada vaga, por essa ou aquela razão.

Tanto assim que o dono da caneta que nomeia chega a dizer, e ninguém se escandaliza com isso, que a responsabilidade pelo desempenho dos ministros que não forem de sua cota pessoal é das legendas que os indicaram.

Mas, na atual temporada de loteamento da Esplanada dos Ministérios, pelo menos em um caso o presidente se abriu o suficiente com os seus interlocutores para que se possa afirmar que ele tende a fazer, por livre e espontânea vontade, uma daquelas infelizes nomeações políticas, em detrimento das qualificações técnicas que finge ser o seu critério por excelência de seleção.

E não se trata de politizar um Ministério de fundo de quintal, como os que andou criando para acomodar a companheirada no primeiro mandato. Trata-se, nada menos, do Ministério da Educação, cuja importância para o país não precisa ser demonstrada nem pode ser subestimada.

No seu encontro com a cúpula do PMDB, o presidente só faltou soletrar o nome da ex-prefeita Marta Suplicy para identificar quem escolheu para a Pasta.

“Será uma ministra”, anunciou - e não houve quem saísse da conversa imaginando que a ministra seria, digamos, a também ex-prefeita e ex-deputada Angela Guadagnin, a da dança da pizza.

Por que Marta? A resposta errada é porque Lula se dobrou a uma exigência do PT.

No último fim de semana, como se sabe, o diretório nacional do partido apresentou-lhe a fatura de que se julga credor por ter elegido, apesar da fieira de seus próprios escândalos, a segunda maior bancada da Câmara, com 83 cadeiras, apenas 8 a menos que em 2002 - e por ter levado o companheiro Arlindo Chinaglia à presidência da Casa.

Nas suas demandas, os petistas fizeram questão de destacar a Educação, “um dos eixos do programa de governo vencedor em outubro último”.

Não por isso, poderia ter respondido o presidente, se pensasse nas próximas gerações e não na próxima eleição.

O atual ministro, Fernando Haddad, além de petista, está dando conta da menina dos seus olhos no setor: o apregoado pacote que prevê mais do que dobrar o total de vagas nas universidades federais.

Ocorre que Marta é a única petista cinco-estrelas que não apenas sobreviveu inteira aos escândalos, mas ainda se fortaleceu como presidenciável.

Chefiando a campanha paulista de Lula no segundo turno, ela o ajudou a receber 2,6 milhões de votos novos. Para retribuir e robustecer as suas aspirações, ele teria pensado em nomeá-la titular das Cidades. Como o PP fincou pé em manter ali o seu único ministro, Lula capturou a Educação.

Que retrocesso! Desde 1995, a Pasta esteve aos cuidados de dois ex-reitores, Paulo Renato Souza e Cristovam Buarque, um político e um acadêmico.

O político, Tarso Genro, nomeou o acadêmico, Fernando Haddad, secretário-executivo do Ministério e praticamente lhe entregou a sua condução. Tanto ele se houve bem que Lula o promoveu a ministro, quando mandou Genro cuidar do partido.

Este jornal muitas vezes o criticou, mas nunca questionou as suas qualificações. Formado em direito, pós-graduado em economia, doutor em filosofia e professor de ciência política na USP, Haddad acrescenta ao seu perfil técnico a propensão para o diálogo.

O retrocesso que se desenha é portanto triplo: a irrupção em cena de uma figura voluntariosa, pouco afim com a área e, pior ainda, a degradação do Ministério em trampolim eleitoral.

 

Fonte: O Estado de S. Paulo, Editorial, 15/2/2007.


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