"O Silêncio dos Intelectuais"



Começou nesta segunda-feira, 22, às 19h, o 1º Ciclo de Conferências "O Silêncio dos Intelectuais" que discute o papel dos intelectuais na sociedade do Século XXI, em relação à política e ao pensamento.

Promovido pelos Ministério da Educação e da Cultura, o ciclo é composto por 16 videoconferências que serão realizadas entre os dias 22 de agosto e 5 de outubro.

O evento vai reunir personalidades das áreas de Educação, Filosofia e Literatura, que debaterão diferentes assuntos relacionados aos intelectuais, via internet, com transmissão ao vivo para várias instituições brasileiras, entre as quais as universidades federais.

A primeira intelectual a abrir o Ciclo foi a professora de Filosofia da USP, Marilena Chaui, que falou sobre "Intelectual engajado, figura em extinção?".

Eis um sumário da intervenção de Marilena Chauí, divulgado no site do ciclo:
“Intelectual engajado, figura em extinção?"

A presença dos intelectuais na vida pública não é um acontecimento recente: Tales de Mileto, Parmênides de Eléia e Heráclito de Éfeso foram legisladores em suas cidades.

Platão dedicou parte de sua vida a mudar o governo de Siracusa e Aristóteles foi tutor de Alexandre.

Há marcos que podem nos ajudar a avaliar a importância dessa presença pública: o papel dos philosophes na Ilustração e na Revolução Francesa, o fato de Marx haver dedicado uma obra a eles, “A Ideologia Alemã”, o surgimento do conceito de "intelectual orgânico" na obra de Gramsci.

Desde o ‘caso Dreyfus’ e do artigo de Zola conclamando os intelectuais a tomar posição, a participação deles na agitação política e seu papel nas vanguardas culturais tornaram-se parte da vida social do Ocidente.

A polêmica entre Sartre e Merleau-Ponty, nos anos de 1950, evidenciou a questão do engajamento político, do qual a década de 1960, no mundo inteiro, deu mostras de vigor.

Hoje e cada vez mais, ao contrário, os intelectuais identificam-se com os universitários e os pesquisadores de laboratórios e centros de pesquisa, retraindo-se da vida pública. Por quê? É o que tentaremos responder.”

Nesta terça-feira, 23, Marcelo Coelho aborda o tema “Contra as paixões políticas”.

Eis o sumário de sua conferência:

“Verdade e contra-verdade
‘Sou um funcionário da verdade’, afirmou André Gide, quando decidiu publicar suas críticas à União Soviética, país que visitara com muitas esperanças em 1936.

‘Justiça e Verdade’, essas foram as palavras de ordem do movimento dos intelectuais em favor do capitão Dreyfus, condenado por traição num clamoroso caso de anti-semitismo e parcialidade judicial na França de fins do século 19.

Um intelectual que usasse esses termos hoje talvez fosse qualificado de arrogante. Julien Benda, num livro publicado em 1927, ‘La trahison des clercs’ – que traduziríamos mal se chamássemos apenas de “A traição dos intelectuais –, condenava a submissão dos homens de letras, dos filósofos, dos cientistas, dos ‘clérigos’, às paixões políticas.

‘Não é apenas a moral universal que os clérigos modernos arrojaram ao desprezo dos homens, é também a verdade universal. Aqui os clérigos se mostraram verdadeiramente geniais no seu empenho de servir às paixões laicas.’

O tom, as preocupações, as referências, o vocabulário de Julien Benda podem parecer atualmente bastante fora de moda. Mas será que, depois de tantos vexames, desencontros e disparates protagonizados pelos intelectuais no curso de seus engajamentos políticos durante o século 20, as idéias de Benda não deveriam ser retomadas?

Quais os limites do engajamento, da participação dos intelectuais no debate público? Há condições para que esse debate se exerça? Em nome de que valores, aliás?

Situações em que o campo do ‘bem’, da ‘justiça’ e da ‘verdade’ estava definido com clareza foram mais exceção do que a regra durante o século passado.

O que é diferente de dizer que tais valores não devam ser invocados.

Por outro lado, a defesa de uma independência ideológica, de uma livre neutralidade, ao estilo de Karl Mannheim, por exemplo, não deixa de ter acarretado problemas éticos de difícil solução.

Valores absolutos, causas específicas: estaria aí, talvez, uma conjunção capaz de recuperar satisfatoriamente a pertinência dos intelectuais na vida contemporânea?”

Nesta quarta-feira, 24, o debatedor será o ministro da Educação, Fernando Haddad, mestre em Economia e doutor em Filosofia pela USP, abordando o tema "Novo intelectual, nova classe?".

A sinopse das conferências do 1º Ciclo de Conferências - "O Silêncio dos Intelectuais" podem ser obtidas no endereço:
<http://www.cultura.gov.br/foruns_de_cultura/cultura_e_pensamento/conferencias>

Confira abaixo a programação:

"Intelectual engajado, figura em extinção?" - Marilena Chaui, 22 agosto
"Contra as paixões políticas" - Marcelo Coelho, 23 agosto
"Novo intelectual, nova classe?" - Fernando Haddad, 24 agosto
"No silêncio do pensamento único: intelectuais, marxismo e política no Brasil" - Francisco de Oliveira, 29 agosto
"O imperativo ético de Sartre" - Franklin Leopoldo e Silva, 30 agosto
"A crise dos universais" - Sérgio Paulo Rouanet, 31 agosto
"Dilemas trágicos do intelectual" - Francis Wolff, 12 setembro
"Marx, o jornalista e o espaço público" - Géraldine Muhlmann, 13 setembro
"O peso das palavras" - Michel Déguy, 14 setembro
"O pastor da noite" - Jean-François Sirinelli, 19 setembro
"Intolerância religiosa e a morte de um intelectual" - Newton Bignotto, 20 setembro
"A sedução relativa" - Antonio Cicero, 21 setembro
"O silêncio dos Céticos" - José Raimundo Maia Neto, 26 setembro
"Ave, palavra!" - Haquira Osakabe, 27 setembro
"Palavra sobre palavra" - José Miguel Wisnik, 28 setembro
"O cientista e o intelectual" - Renato Janine Ribeiro, 5 outubro

 


Às vezes o silêncio é um dever, diz Chauí em
“O Silêncio dos Intelectuais”


Pensadora ligada ao PT afirma que não entendeu a crise e que o governo, ao se assumir como de transição, caiu em armadilha tucana


Na abertura do seminário "O Silêncio dos Intelectuais", nesta segunda-feira, no RJ, a filósofa Marilena Chaui, uma das principais pensadoras ligadas ao PT, voltou a se recusar a fazer uma análise da crise do partido e do governo Lula.

Evitando as perguntas dos jornalistas, Chaui disse que não escreveu nem deu entrevistas sobre a crise porque ainda não conseguiu compreendê-la.

"Há momentos em que o silêncio é o dever de um intelectual. Pois não se trata de dar opiniões, mas de oferecer uma análise."

Na opinião de Chaui, "é preciso ‘serenidade’ neste momento. A filósofa não deixou de apontar, porém, o que considerou um "erro de timing" do governo Lula.

"A primeira ação [do governo] deveria ter sido a reforma tributária, para que houvesse distribuição de renda e o Fome Zero fosse possível.

Mas a primeira reforma feita foi a previdenciária, a que Fernando Henrique não teve coragem de fazer."

Para ela, ao se "assumir como transição, e não transformação, o governo caiu em uma armadilha tucana de que os petistas não se deram conta".
A segunda reforma, segundo Chaui, deveria ter sido a política, já que "o sistema político brasileiro é uma aberração".

"Enquanto não houver reforma política, continuaremos gritando contra a corrupção e o mau-caratismo dos políticos, mas não resolverá nada", disse a professora de filosofia política e história da filosofia moderna na USP.

Alianças

As afirmações mais diretas sobre a crise vieram depois da pergunta de um espectador sobre a aliança do PT com políticos de forças tradicionalmente opostas às do partido.

"Durante anos, o PT foi violentamente criticado por não fazer alianças, já que partido moderno tinha de fazer alianças. Aí ele fez...", afirmou ela, fazendo uma expressão de "deu no que deu".

A filósofa não fez comentários sobre o futuro do PT e seus dirigentes. Sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apenas disse que ele não é um caudilho.

"A marca do caudilho é a solidão, porque ele acredita na força de seu carisma e tem uma relação direta com as massas. Lula vem do movimento sindical, de um partido político, relaciona-se com a sociedade por meio de mediações institucionais, inclusive do Congresso Nacional", disse.


Fonte: Folha de S. Paulo, Luiz Fernando Vianna (RJ), 23/8/2005.


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