Em homenagem a Paulo Renato, Consuni acaba com vestibular da UFRJ e aprova adesão total ao Enem
 

Em uma decisão-relâmpago e comunicada à comunidade acadêmica através da chamada grande imprensa, provavelmente para homenagear veladamente a memória do ex-Ministro da Educação Paulo Renato Souza, morto no último dia 26 de junho, em São Paulo, o Conselho Universitário da UFRJ decidiu acabar com o próprio exame vestibular da instituição e aprovou adesão total ao Enem.

Paulo Renato, como se sabe, foi o criador do Enem e também do Exame Nacional de Cursos, o antigo Provão, que hoje atende pelo nome de Enade, elaborados durante o governo FHC nos 1995-2002. Até hoje não se sabe ao certo para que servem ou a quem servem afinal, o Enem e também o Enade.

Universidades como a USP e até a Unicamp, onde o ex-ministro PRS foi inclusive reitor, jamais cogitaram aderir a esses dois exames nacionais, saudados por alguns entretanto, como importantes instrumentos de avaliação da qualidade do ensino e/ou iniciativas viabilizadoras de “uma política de Estado para a educação, e não apenas uma política de governo” (sic).

Noves fora o fato de que ambos os exames representam apenas formas polêmicas de medição, com influência duvidosa sobre os destinos da educação brasileira, é importante assinalar que políticas de Estado, mesmo as de Educação, devem ser originadas de diagnósticos consistentes acerca da realidade. Por sua vez, tais diagnósticos demandam a elaboração de planejamentos estratégicos, nos quais a questão da avaliação integra normalmente os diversos planos de ação, formalizando juízos de valor e subsidiando tomadas de decisões. Não se assemelham e nem decorrem portanto, de excrescências do marketing político fautoras de estatísticas e rankings que apenas consagram desigualdades, como parece ser o escopo tanto do Enem como do Enade.

Com efeito, o surgimento de ambos os exames não impediu o fracasso do Plano Decenal da Educação-PNE no período 2001-2010, sendo que o Enem em nada contribui para auxiliar os encaminhamentos que possibilitem a superação da reconhecida tragédia que acomete dramaticamente o ensino médio brasileiro.

Tributário da baixa qualidade do ensino fundamental, que matriculou menos de 84% da população em idade escolar em 2009 (31.705.50 estudantes), o ensino médio logrou matricular apenas 8.222.701 alunos naquele mesmo ano, deixando de incluir mais de 4.300.000 estudantes ao longo de suas três séries, segundo dados do INEP.

Como se isso não bastasse, as matrículas da terceira série do ensino médio em 2009 (n= 2.146.547), foram decrescentes com relação aos anos de 2008 (n= 2.176.547) e 2007 (n= 2.211.998) respectivamente.

No agravo de todo esse quadro, um relatório divulgado em 2007 pela Câmara de Educação Básica, do Conselho Nacional de Educação-CNE, concluiu que faltavam na ocasião pelo menos 245 mil professores no ensino médio, configurando-se então a condição de vulnerabilidade indutora de um iminente apagão educacional.

Concordando-se ou não com a previsão de tal apagão, o fato é que já em 2008, o número de concluintes do ensino médio em todo o país, foi de apenas 1.761.425 estudantes, claramente inferior ao quantitativo de 2.985.137 vagas ofertadas no ensino superior público (n= 344.038) e privado (n=2.641.099).

Não obstante essas evidências, em decisão claramente autoritária, o Consuni deliberou adesão total ao Enem, caçando oficialmente a própria autonomia universitária, uma vez que a UFRJ perderá o controle do processo de seleção de seus alunos.

Esse autoritarismo desconsiderou igualmente as aflições resultantes das medidas que estabeleceram a adoção parcial do Enem na UFRJ, no passado mais que recente, que provocaram enormes perdas e adiamentos de aulas previstas no calendário acadêmico, por conta das trapalhadas logísticas do Ministério da Educação e das empresas privadas que foram selecionadas para a implementação do “serviço”.

Finalmente, o autoritarismo do Consuni foi consolidado com a referida deliberação à revelia de qualquer consulta às coordenações de cursos, às unidades acadêmicas e ao CEG – instância que conta inclusive com uma Comissão de Acesso - o que sugere total desconsideração ao próprio Estatuto e ao Regimento da UFRJ.

Não cabe portanto, segundo o texto do jornalista Bruno Franco – Jornal da UFRJ, a afirmação patética de que essa decisão resultou “de intenso e democrático debate”, uma vez que democracia é o regime baseado fundamentalmente na ampla e qualificada representatividade.

Muito pelo contrário, a adesão ao Enem, de forma integral e em nome de toda a UFRJ, foi resultante tão somente de uma clara impostura, deliberada isoladamente pelo Consuni, cujos propósitos inconfessáveis devem estar incluindo no mínimo, uma velada homenagem póstuma à memória e à obra do ex-ministro PRS.
 

 

Fonte: Leandro Nogueira/ ADUFRJ

 


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