Começa a grande corrida da física
Marcelo Gleiser*

 

 

A maior máquina para estudar a menor partícula
 

3...2...1...e "voilà"! Aplausos e muita champanha celebraram ontem o primeiro teste do LHC. Em um segundo, um feixe de prótons completou nada menos do que 11 mil voltas em torno de um túnel de 27 km de extensão.

Quando o acelerador funcionar para valer, nos próximos meses, feixes de prótons viajando em direções opostas irão colidir a energias que reproduzirão, por frações de segundo, as condições prevalecentes instantes após o Big Bang, o evento que deu origem ao Universo.

Talvez nenhum experimento na história da ciência tenha sido esperado com tanto entusiasmo e tanta ansiedade. O LHC (Grande Colisor de Hádrons) é a maior máquina já construída. Milhares de cientistas e engenheiros de dezenas de países dedicaram anos de suas carreiras ao experimento.

O acelerador é dotado de enormes detectores, essencialmente máquinas fotográficas de extrema resolução que registram os resultados das colisões entre as partículas. É no interior dos detectores que feixes de prótons colidem uns com os outros, transformando sua energia em matéria segundo a famosa fórmula E = mc2.

A cada volta, os prótons são acelerados um pouco mais, até atingirem as energias necessárias. Quanto mais longo o percurso, mais altas as energias, explicando as enormes dimensões do túnel do acelerador.

A maior máquina de todos os tempos é usada no estudo das menores entidades da natureza, os tijolos fundamentais da matéria. O principal objetivo do LHC é elucidar o mistério da massa.

Sabemos que um elétron é 2.000 vezes mais leve do que um próton, mas não sabemos por quê. A teoria mais aceita afirma que uma partícula, o bóson de Higgs, é responsável pelas massas não só dos elétrons e dos prótons como as de todas as partículas: cada partícula interage com o Higgs com uma intensidade diferente, e é essa diferença que determina a sua massa. O LHC atingirá as energias necessárias para descobrir o Higgs e estudar as suas propriedades.

Ou não. É possível que o Higgs não exista ou que seja feito de outras partículas. Ao investigar a natureza a energias nunca dantes vislumbradas, é muito possível que ocorram surpresas. O LHC abre uma janela para uma realidade desconhecida.

Outra possibilidade é que o LHC descubra as partículas invisíveis que supostamente explicam as anomalias observadas nos movimentos das galáxias, ou que produza miniburacos negros apontando para teorias que prevêem a unidade das forças que agem sobre a matéria. Apesar do temor de muitos, o LHC não apresenta qualquer perigo para a existência da Terra. Na pior das hipóteses, ele demolirá algumas teorias sobre a matéria e sugerirá outras, contribuindo para o nosso conhecimento do Universo.

 

* Marcelo Gleiser é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "A Harmonia do Mundo".

Fonte: Folha de S. Paulo, 11/9/08.

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