Longe do quadro-negro

 

Evasão de estudantes dos cursos de formação de professores agrava ameaça de
“Apagão do Ensino Médio”, temida pelo MEC
 

O alto índice de evasão nos cursos de formação de professores nas universidades brasileiras é um dos desafios a serem enfrentados pelo governo para evitar a ameaça de um “Apagão no Ensino Médio”, conforme alerta do próprio Ministério da Educação (MEC), noticiado por O DIA desde domingo. No curso de Licenciatura em Química, o percentual de alunos que abandonam a faculdade chega a 75%. No Estado do Rio, a situação se agrava ainda mais com o afastamento de docentes das salas de aula. De janeiro a agosto, 2.139 professores se desligaram das escolas em razão de aposentadorias, readaptação, exoneração e demissões.

Segundo o relatório do Conselho Nacional de Educação concluído em maio, as escolas públicas brasileiras precisam de 402.749 professores de Matemática, Física, Química, Educação Artística, Geografia e Biologia. Entretanto, de 1990 a 2005 só saíram dos bancos das universidades 368.688 mestres destas disciplinas. O déficit em Física e Química é dos mais preocupantes: faltam mais de 55 mil docentes para cada uma, mas em 15 anos só foram diplomados 13.504 professores de Física e 23.925 de Química.

Nas turmas de Matemática a situação é semelhante. A evasão do curso chega a 56%. A maioria abandona a faculdade em busca de carreiras com mercado de trabalho mais amplo e melhores perspectivas de salário.

Foi assim com Caroline Eccard. No ano passado, aos 19 anos, ela decidiu mudar de rumo. Largou sua turma de Matemática na Uerj para fazer curso de Gestão em Petróleo e Gás. “Em pouco tempo de faculdade tive a certeza de que não queria ser professora. Fazer plano de aula, corrigir prova, não é para mim. Minha mãe é professora e sei como é. A faculdade é puxada e depois de formada você trabalha muito, mas o salário não compensa”, afirma Caroline, que complementa sua formação com um curso de Técnico em Eletrônica. “Tem empresas na área de Petróleo que pagam até R$ 30 mil”, enfatiza.

Fernanda Schetine foi outra que não se animou com a carreira de professora. Depois de dois períodos de Biologia, trocou a Uerj pela UFRJ, onde foi fazer faculdade de Rádio e TV. “Desisti, pois percebi que não queria ser professora: ia trabalhar sem parar e sem ganhar um salário justo. Foi uma decisão difícil, mas não me arrependo”, diz ela, que hoje trabalha na produção da TV Câmara.

A formatura de turmas de licenciatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro é uma tradução da crise que a educação do País enfrenta. Em 2005, se graduaram 22 professores de Matemática. No ano seguinte, esse número caiu pela metade. Em Física, foram apenas 12 alunos os que chegaram ao fim do curso no ano passado.

E o problema está longe de ter solução. Mesmo antes do alerta do MEC, o Rio já enfrentava uma carência estrutural de professores que este ano culminou na maior crise da rede estadual de ensino. O déficit de docentes deixou cerca de 37.500 alunos de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental sem aulas, e mais de 420 mil estudantes nos demais segmentos. Depois de 184 dias letivos, com as turmas já no terceiro bimestre, o governo estadual ainda não solucionou o problema.

Exoneração da rede estadual

A falta de estrutura na escola, aliada às péssimas condições de trabalho e ao baixo salário, levou a professora de Matemática e Física Gisele Leite da Silva, 25 anos, a pedir exoneração do estado para se dedicar exclusivamente ao mestrado.

“Ganhei bolsa de R$ 940 e tive que optar entre estudar ou dar aula. Então decidi pelo mestrado”, diz Gisele, que recebia R$ 481 como professora, com uma carga horária de 12 horas/aula no Colégio Estadual Guadalajara, em Duque de Caxias. Gisele não pensa em voltar ao Ensino Médio. “Vou fazer doutorado e ser professora universitária”, diz.

Gisele conta que muitos alunos do 2º ano do Ensino Médio não dominavam as quatro operações. “Não sabiam somar, dividir, diminuir ou mutiplicar. Tentei recuperá-los, mas reclamaram que estava pegando ‘pesado’ demais”, conta.
 

 

 

 

Fonte: O Dia, Carol Medeiros e Maria Luisa Barros, 14/8/2007.

 

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