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ADUR Online #44: Porque o Estado importa

ADUR Online

7 de junho de 2021

Por Tadeu Alencar Arrais e Juheina Lacerda Viana

*Texto originalmente publicado no site Jornal UFG

 

O Estado Criminalizado: servidores públicos e reforma administrativa

 

Estimativas apontam que o Brasil poderá ultrapassar, até o meio do ano, mais de meio milhão de mortes em decorrência da covid-19. É no momento mais sensível de nossa história contemporânea que a PEC-32, proposta de Emenda à Constituição, volta ao debate político. O discurso de criminalização dos servidores públicos, em rede nacional, é sustentado pelo seguinte tripé retórico: o Estado brasileiro é grande, oneroso e ineficiente. Abre-se, em plena pandemia, a oportunidade para implementar políticas de privatização que têm como objetivo drenar a renda pública para o mercado.

Persiste, nas alusões negativas sobre o Estado, uma espécie de obsessão comparativa. É preciso sempre lembrar da geografia. O Brasil não é a Dinamarca. Nada se compara ao Brasil e não apenas pela população de 210 milhões de habitantes ou pelos 8,5 milhões de Km2. Vivemos em um país em que a escravidão determinou, ao mesmo tempo, a forma de organização do mercado de trabalho e os sistemas de reprodução social.

A comparação mais recorrente, criada para gerar espanto, refere-se ao suposto duelo entre os empregos da iniciativa privada e os empregos do setor público. O duelo entre a eficiência e a ineficiência. O serviço público concentrou, em 2020, 21% do total dos empregos formais. O propósito é sempre demonstrar como o emprego público, ao longo dos 30 anos, cresceu em relação ao emprego privado, o que motiva uma atmosfera de desconfiança para com os servidores públicos. É preciso entender, antes de tudo, que o Artigo 41 da Constituição Federal garantiu a estabilidade do funcionalismo que ingressou a partir de concurso público. A curva do quadro do funcionalismo público será, sempre, mais estável que aquela do mercado privado, mais sujeita à conjuntura do desemprego, algo esquecido, oportunamente, em prestigiosos relatórios publicados pelo Instituo Millenium (2020) e pelo Banco Mundial (2019). Em 1991 eram 5,1 milhões e em 2020 12,1 milhões de funcionários públicos. A imagem gráfica impressiona e todos começam a se perguntar: cabe, no Brasil, tanto funcionário público?

A imprensa hegemônica e o governo federal não divulgam, no entanto, que o Brasil passou de 146 milhões de habitantes, em 1991, para mais de 210 milhões de habitantes em 2020. Isso mesmo. Um acrescimento de 64 milhões de pessoas (mais de 10 Dinamarcas!) que precisam frequentar escolas e creches públicas, acionar serviços nos postos de saúde públicos e nas delegacias de polícia. Os direitos sociais vinculados a educação, moradia, lazer e saúde, expressos no Artigo 6º da Constituição Federal, não são abstratos. Sua materialização em um território de 8,5 milhões de quilômetros quadrados exigiu, ao mesmo tempo, investimento em infraestrutura física (escolas, creches, postos de saúde, delegacias etc.) e em pessoal (professoras, merendeiras, enfermeiras, odontólogos, policiais militares etc.). Quem diria, considerando os desafios de universalização da saúde e da educação, que o Estado é grande?

Outra comparação recorrente refere-se ao PIB. Para os defensores da reforma administrativa, inclusive, parece que o funcionalismo não gera PIB e que o investimento público também não. Em apenas sete anos, entre 1991 e 2019, há registro de déficit no exercício fiscal, o que é, sabidamente, ocultado pela mídia e pelo governo. O Estado, para os burocratas de plantão, parecer ser uma instância apartada da realidade. O emprego público, na lógica dos defensores da reforma administrativa, não é trabalho. Fingem não saber que, além de permanecem no front da batalha contra a COVID-19, especialmente os profissionais da saúde, da segurança pública e da educação, o salário desse universo de servidores públicos tem, no momento de desemprego e redução da renda, amparado o consumo dos núcleos familiares. Nos momentos de crise, o funcionário público transformou-se em arrimo de família. A renda de agentes administrativos, profissionais da enfermagem, professoras, policiais, entre tantas outras funções, transformada em consumo, é convertida em PIB. São, aproximadamente, 5,6 milhões de funcionários públicos municipais, 2,9 milhões de estaduais e 1 milhão de federais.  É o salário dos funcionários públicos que impulsiona a economia de centenas de municípios brasileiros.

 

 

A narrativa geral aponta o funcionalismo público como culpado pela situação fiscal do país, de modo geral, e do funcionalismo federal, de modo particular. Com a lupa, a culpa recai sobre as costas do Executivo Federal e, especialmente, dos servidores da Educação. Não do Legislativo, não do Judiciário e não dos Militares. A generalização esconde os privilégios não denunciados. Esconde o receio em desagradar, ao mesmo tempo, aqueles que Legislam, aqueles que Julgam e aqueles que Portam Armas. A bajulação é a norma de conduta das elites tecnocráticas.

Tomar o funcionalismo federal como um bloco homogêneo é a melhor forma de camuflar as diferenças. A média da remuneração dos servidores do executivo federal, com nível médio, em 2019, foi de R$ 5,9 e nível superior R$12,5 mil, nada comparado ao legislativo, com R$ 17,2 para ao nível médio e R$ 27,4 para o nível superior. É bom repetir. Um funcionário do legislativo, com nível médio, recebe 2,9 vezes mais que um funcionário do executivo no mesmo nível.

O caso do Ministério da Educação é paradigmático. São 351.191 vínculos, representado 33,5% do total dos 1.045.555 funcionários federais. Enganam-se, no entanto, aqueles que acham que o Ministério da Educação seja o campeão de vínculos. O Ministério da Defesa, no mesmo período, apresentou 387.338 vínculos distribuídos entre os Comandos da Aeronáutica, da Marinha e do Exército. O total de vínculos dos três comandos é maior que a soma total dos vínculos de todas universidades federais, de todos os institutos federais, da globalidade do Ministério da Saúde, sobrando ainda espaço para adicionar órgãos como o INSS, o IBGE e a Polícia Rodoviária Federal.

A estrutura burocrática do Estado brasileiro, expressa na Constituição de 1988, não é de fácil compreensão. É complexa porque o país é complexo. Ninguém, de fato, escapa de sua teia protetiva, bastando para isso citar a Seguridade Social ou mesmo os investimentos na saúde decorrentes da crise sanitária. A escala de atuação nessas situações e também no combate à fome, devido ao montante de recursos demandados, só pode ser estatal. Dar visibilidade ao Estado Social é parte do esforço do Observatório do Estado Social Brasileiro. Nosso esforço não seria necessário se, cada um de nós, reconhecêssemos que, em algum momento de nossas vidas, travamos contato com essa instituição política. Responda essas três interrogações:

  1. Folheie o cartão de vacina do seu filho. Será, ele, uma das crianças que recebeu, entre 2010 e 2019, umas das 154 milhões de doses de vacinas como a BCG, a Oral Poliomelite e a Pentavalente?
  2. Olhe para os hospitais. A maior fração dos leitos de UTI e leitos ambulatoriais são do Sistema Único de Saúde. Você admite que o combate à pandemia tem sido um empreendimento, essencialmente, público?
  3. Pense na universidade pública e na escola pública. Será que, em algum momento de sua vida, uma dessas instituições não cruzou o seu caminho?

Se essas experiências forem negativas, mesmo assim, você ainda terá razões para acreditar na potência do Estado Social brasileiro. Sendo o principal ativo de nossa jovem democracia, o Estado social tem garantido, aos mais vulneráveis, alguma expectativa de futuro. O privilégio dos servidores públicos, apesar dos problemas e desafios, é, justamente, aquele de poder participar ativamente da construção desse futuro.

Sorte e saúde para todos.

Acesse informação de qualidade sobre a funcionalismo público

Lembre-se. Se a vacinação pública importa é porque o SUS se importa com você.

Plataformas de Dados do Observatório do Estado Social Brasileiro.

Canal Porque o Estado Importa no YouTube.

 

 

Fontes

Banco Mundial. Gestão de pessoas e folha de pagamento no setor público brasileiro. In. http://obsestadosocial.com.br/documentos/gestao-de-pessoas-e-folha-de-pagamentos-no-setor-publico-brasileiro/. Acesso em 25/05/2021.

Constituição Federal de 1988. Brasília. Planalto. In.: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.

Folha de São Paulo. In.:http://arte.folha.uol.com.br/graficos/d4A1J/.

IBGE. Evolução da população. In.:https://brasil500anos.ibge.gov.br/estatisticas-do-povoamento/evolucao-da-populacao-brasileira.html.

Instituto Millenium. Reforma administrativa: diagnóstico sobre a empregabilidade, o desempenho e a eficiência do Setor Público brasileiro. Publicado em 2020. In.: https://campanha.institutomillenium.org.br/wp-content/uploads/2020/08/Reforma-administrativa-Vers%C3%A3o-final.pdf. Acesso em …

Observatório do Estado Social Brasileiro. Dados. In.:http://obsestadosocial.com.br/leis/page/2/.

Orçamento 2020 aprovado. https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2019/12/27/orcamento-aprovado-pelo-congresso-para-2020-e-o-mais-restritivo-dos-ultimos-anos.

RAIS. Programa de Disseminação das Estatísticas do Trabalho. Dados do Relação Anual de Informações Sociais – RAIS – Ano de 2018 publicados em 2019 no site da Secretaria do Trabalho [Ministério da Economia]; http:// trabalho.gov.br/rais.

Ministério da Saúde – Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde do Brasil – CNES (Datassus)

 

* Tadeu Alencar Arrais é professor do Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa) da UFG e coordenador do Observatório do Estado Social Brasileiro. Email: tadeuarraisufg@gmail.com

* Juheina Lacerda Viana é integrante do Observatório do Estado Social Brasileiro. Email: juheinalacerda@hotmail.com

 

*ADUR ONLINE é um espaço aberto aos docentes  e pesquisadores da UFRRJ e de outras Universidades também. As opiniões expressas no texto não necessariamente representam a opinião da Diretoria da ADUR-RJ.


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