“Apartheid vacinal”: o surgimento da variante ômicron e a desigualdade na distribuição de vacinas contra a COVID-19 no mundo
7 de dezembro de 2021
Reportagem da Semana
Por Larissa Guedes
Ao longo desta última semana, o surgimento da variante ômicron do novo coronavírus dominou os noticiários nacionais e internacionais. A nova cepa, definida pela Organização Mundial da Saúde como “variante de preocupação” por ser considerada altamente transmissível, havia sido primeiramente detectada na África do Sul e em Botsuana, em 25 de novembro.
No dia seguinte após a detecção, a Holanda fez testes e isolou passageiros diagnosticados com COVID-19 vindos de um voo da África do Sul. No entanto, na última terça-feira, 30 de novembro, o Instituto Nacional de Saúde Pública e Meio Ambiente da Holanda (RIVM) lançou um comunicado informando que amostras coletadas de pacientes infectados em meados do mês de novembro revelaram que a variante já estava na Holanda antes da detecção feita pelas nações africanas.
A questão é que, pelo fato de terem informado primeiro sobre a nova cepa, a África do Sul, Botsuana e outras nações africanas passaram a sofrer inúmeras restrições por parte de outros países, que fecharam imediatamente suas fronteiras para quaisquer pessoas que estivessem partindo do continente.
O presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, denunciou o isolamento por conta das ações de fechamento das portas de países da União Europeia e dos Estados Unidos para viajantes oriundos do continente africano, pontuando que essa movimentação está em desacordo com compromissos estabelecidos na reunião do G20 ocorrida no último mês.
Em nota, o governo sul-africano questionou o porquê da qualidade científica de seus profissionais – ao sequenciar rapidamente o genoma da nova cepa do vírus – estar sendo um “castigo” com isolamento e restrições. O primeiro-ministro da Saúde da África do Sul, Joe Phaahla, também se manifestou afirmando considerar que “os líderes de alguns países estão encontrando bodes expiatórios para lidar com aquilo que é um problema mundial”.
“A desigualdade na distribuição e no acesso às vacinas é algo que deveria causar vergonha”, afirma epidemiologista

À frente, dados da transmissão da COVID-19 no mundo ainda no início da pandemia e ao fundo, o diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS),Tedros Adhanom. Imagem: reprodução Época Negócios.
Segundo levantamento com a contagem de vacinados globalmente feito pela Universidade de Oxford, de cada 100 pessoas, apenas 3 foram imunizadas contra a COVID-19 nos países mais pobres do mundo. De acordo com dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças da África (CDC), a porcentagem da população dos 54 países do continente com a vacinação completa é de apenas 7%, se configurando como a taxa de imunização mais baixa do mundo.
Enquanto isso, países como Portugal já atingiram quase 90% de taxa de vacinados, segundo dados da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed), de Lisboa. Ainda em maio deste ano, o diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Tedros Adhanom, definiu o quadro que o mundo vive hoje como um “apartheid de vacinas”.
Para o médico, pesquisador da área de Epidemiologia de Doenças Infecciosas e professor no Instituto de Medicina Social da Uerj e no Instituto de Estudos de Saúde Coletiva da UFRJ, Guilherme Werneck, o surgimento da variante ômicron é um indicativo que a pandemia não vai acabar enquanto a circulação do coronavírus não for controlada de forma igualitária em diferentes países e continentes do mundo.
“Enquanto o vírus circula livremente em países com baixa cobertura vacinal, sempre haverá possibilidade de surgimento de uma nova variante que pode, de alguma forma, mudar o panorama epidemiológico da pandemia”, alerta ele.
O médico considera que, com todos os avanços tecnológicos e científicos na área da saúde que foram capazes de gerar vacinas em um tempo recorde, a desigualdade na distribuição e no acesso aos imunizantes deveria causar vergonha nas pessoas e nos países.
“É inadmissível que exista uma pandemia com a circulação de um vírus no mundo inteiro e você pense que você possa estar protegido vacinando apenas a sua própria população. O mundo hoje é totalmente ligado e ter países e continentes que não tenham conseguido vacinar nem 5% da sua população é um absurdo e só contribui por um lado, para as desigualdades em saúde e a piora das condições em populações já vulnerabilizadas, que já vivem em situação de pobreza. Essa situação apenas contribui para agravar ainda mais essas desigualdades e ao mesmo tempo, permite que a circulação do vírus mantenha a pandemia ainda em atividade. Ninguém está protegido se todos não estiverem protegidos”, declara.
Entretanto, embora países da Europa estejam estocando vacinas desde o momento que os imunizantes foram testados e aprovados, existe uma outra problemática por lá que não envolve a oferta de vacinas, mas sim a disposição populacional para se imunizar. Mesmo com a oferta ampla de vacinas, durante o mês de novembro, a Alemanha, por exemplo, viveu um dos piores períodos da pandemia durante a chamada quarta onda, com aumento no número de contaminações e hospitalizações, devido à baixa adesão à vacinação no país.
No início de novembro, a OMS alertou para o fato de quanto menor é a taxa de adesão à vacina, maior é a tendência de aumento nas taxas de hospitalizações. Quanto a isso, o professor Guilherme faz uma projeção importante para pensar os desdobramentos da pandemia a longo prazo.
“Sem a proteção de todos, vai ser muito difícil a gente sair da condição de pandemia rapidamente, ou seja, nós continuaríamos sob a condição que muitas pessoas no mundo inteiro estão adoecendo e morrendo, a circulação do vírus permanecerá, novas variantes podem ocorrer e se disseminar rapidamente pelo mundo. Então, é o momento das pessoas pensarem que não basta você resolver o seu problema pessoal. Pensar localmente é importante, mas em um contexto pandêmico, pensar globalmente é fundamental”, pontua.
Para o pesquisador, países europeus e Estados Unidos, que têm altas rendas, deveriam se juntar para desenvolver e fortalecer instituições multilaterais, como a OMS, para prover acesso às vacinas aos outros países do mundo.
“Países que têm condições de aquisição de vacinas, que tiveram maior quantidade de vacinas do que a necessária hoje para vacinar sua população adequadamente poderiam fazer doações para países mais pobres. Aqui na América Latina, países como o Brasil e o Chile, por exemplo, poderiam contribuir fazendo doações para países como Bolívia, Paraguai e outros da região. Países como os Estados Unidos, países europeus, poderiam também fazer um esforço para aumentar a oferta de vacinas e reduzir a desigualdade da cobertura vacinal nos seus próprios países, mas também em outros países do mundo, principalmente no sudoeste asiático e em países da África”, indica ele.
Brasil: efeitos da desigualdade vacinal também são sinal de alerta para nós
Nesta última quinta-feira, 2 de dezembro, o Ministério da Saúde confirmou a existência de 5 pacientes contaminados com a variante ômicron no país, três deles no estado de São Paulo e dois no Distrito Federal. Mesmo diante deste cenário, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou não haver motivos para fechamentos ou restrições sanitárias, levando em consideração os números do avanço da vacinação no Brasil.
Já o professor Guilherme considera que como ainda existem poucos dados com relação à resposta imune pela vacina e aos marcadores de proteção celular diante da ômicron, é preciso manter o princípio da precaução até que a situação esteja mais definida e verificada.
“É um momento que a gente precisa ter responsabilidade e entender que não podemos flexibilizar completamente a nossa rotina. Não é possível agendar e permitir grandes aglomerações e festividades de fim de ano. Isso, para mim, não é razoável nesse momento e também não é razoável que se permita que as pessoas não usem máscara nesse momento. Importante agora é fortalecer as ações de controle, as medidas de prevenção, a vigilância genômica para saber exatamente como vai circular a ômicron e os estudos sobre o efeito que essa variante tem na efetividade da vacina e o mais importante passo é realmente a vacinação. Tem que vacinar todo mundo, buscar as pessoas que não se vacinaram com a segunda dose, dar a terceira para quem precisa, fazer campanhas de imunização, contrair o máximo de pessoas possível… E uma forma de contribuir para isso é a exigência do passaporte de vacinação, principalmente em situações de ambientes fechados”, indica o epidemiologista.
Werneck ressalta ainda que, para além do aspecto global na desigualdade na distribuição de vacinas e nos recursos de proteção social, como as garantias de segurança sanitária, ainda existe uma desigualdade nacional neste sentido que é imensa.
“Não adianta a gente ficar falando que as pessoas precisam usar máscaras PFF2, é preciso que tenha um programa de distribuição gratuita dessas máscaras, de testes, de antígenos para que as pessoas sejam testadas. É isso que uma política de saúde, uma política social deve fazer para enfrentar esse problema: ampliar a oferta de vacinas, de testes, de máscaras e garantir as condições de sustentação econômica dessas pessoas para que elas consigam permanecer em um grau de isolamento ou pelo menos de proteção que não permita a transmissão do vírus nas comunidades”.
Para o pesquisador, as políticas no Brasil precisam fornecer orientações e estabelecer condições para que as populações invisibilizadas que vivem em situação de vulnerabilidade social sejam capazes de aderir às medidas de prevenção da contaminação pela COVID-19.
“As pessoas não necessariamente aderem fortemente às medidas de prevenção, como uso de máscaras, manutenção do distanciamento físico, por desinformação ou por falta de informação. Existem situações mais complexas, como pessoas que passam por condições gravíssimas com o aumento da pobreza, da insegurança alimentar, etc. As pessoas precisam, no desespero, correr atrás de encontrar condições de vida porque essas condições não são fornecidas pelos gestores de saúde ou gestores em geral (…)
É um fenômeno bem complexo que tem aspectos locais, regionais, nacionais e mundiais. É por isso que é uma pandemia, por isso que não acabou e por isso que a gente ainda tem que realmente trabalhar muito para que seja possível ultrapassar essa situação e que possamos chegar ao momento em que a preocupação seja a reconstrução. Se responsabilidade, generosidade e solidariedade forem as ações que dominem pode ser que a gente chegue em uma situação melhor no ano que vem”, conclui ele.
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