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ADUR Online #49: O lugar do Brasil no mapa… da fome

ADUR Online

12 de julho de 2021

Por Luciano da Franca Alencar do Rego Barros

*Texto originalmente publicado no site da Rede MMT Brasil

Em coluna anterior, ‘a década mais que perdida do Brasil’, busquei expor como a adoção de políticas econômicas desastrosas implicou na depressão observada desde 2015 com lenta recuperação a partir de 2017, recuperação esta que seria interrompida pela crise decorrente da pandemia. Hoje o tema será uma das faces mais tristes desse péssimo desempenho econômico: a volta do Brasil ao mapa da fome.

Entre 2004 e 2014 o país cresceu quase que continuamente – tirando a queda de 0,2% na produção em 2009 como resultado da crise financeira de 2008 -, em um ciclo virtuoso no qual se reduziu o desemprego e o grau de informalidade enquanto houve ganhos reais de salários e expansão do crédito, realimentando a demanda e reforçando o crescimento. Ao mesmo tempo houve uma forte expansão das políticas sociais, com papel de destaque para o programa Bolsa Família e os programas voltados à segurança alimentar, como os programas nacionais de aquisição de alimentos, de alimentação escolar, e de fomento à agricultura familiar.

O resultado deste processo foi que o Brasil deixou, em 2013, de constar no Mapa da Fome da ONU. Este mapa inclui os países onde a insegurança alimentar grave é igual ou superior a 5% da população. Grosso modo, a insegurança alimentar leve representa a expectativa de falta de alimentos no futuro ou quando se abre mão da qualidade dos alimentos para que não haja redução na quantidade; a moderada expressa a redução quantitativa de comida na dieta dos adultos; e a grave quando esta atinge as crianças.

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, a insegurança alimentar grave, que atingia pouco mais de 8% da população em 2004, passou a afligir cerca de 6% em 2009 e 3,6% em 2013. Porém, com a dura depressão iniciada em 2015 e o desmonte progressivo das políticas sociais a partir de 2016, a situação começou a se deteriorar.

A queda abrupta do PIB de 2015 em diante implicou um rápido aumento da taxa de desemprego e do grau de informalidade, com drástica redução da massa salarial real e da taxa de crescimento do salário mínimo. Depois do golpe parlamentar de 2016, passou-se a aprovar reformas liberalizantes, como o teto de gastos, a reforma da previdência e a reforma trabalhista, e a se conter cada vez mais os gastos sociais. A partir de 2017 a economia voltaria a crescer, porém a taxas baixíssimas, em torno de 1,5% ao ano em termos reais.

Como decorrência deste processo o Brasil virtualmente voltou para o Mapa da Fome mesmo antes da pandemia. Segundo a Pesquisa de Orçamento Familiar de 2017/2018, mais de 4,9% da população Brasileira sofria de insegurança alimentar grave, enquanto a insegurança alimentar média afligia cerca de 9%. E a situação iria piorar.

O descaso do governo Bolsonaro com a questão da fome evidenciou-se desde o início do seu mandato. Um dos seus primeiros atos foi a extinção do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional, órgão responsável por formular, monitorar e avaliar políticas públicas de segurança alimentar e nutricional. O abandono dos estoques reguladores de alimentos, por sua vez, deixaria sua oferta e seu preço ao sabor das flutuações abruptas do mercado. A situação que já era ruim — com o abandono de políticas públicas voltadas à questão, a austeridade fiscal e agenda de reformas liberalizantes — tomaria contornos dramáticos com o advento da pandemia.

Com a interrupção das atividades produtivas, a renda nacional chegou a cair mais de 10% no segundo trimestre de 2020 em comparação com o mesmo período do ano anterior. A sangria seria estancada com a aprovação do auxílio emergencial, de início indesejado pelo governo e, depois, proposto com um terço do valor aprovado pelo congresso. Posteriormente o auxílio teve o valor reduzido e seu acesso progressivamente dificultado.

O esboço de recuperação da economia mundial não só não reverteria a situação, como traria impactos negativos em termos de segurança alimentar. Isto porque o aquecimento da demanda mundial por alimentos pressionou seus preços no mercado internacional de forma que o Brasil, com sua moeda extremamente desvalorizada, passou a exportá-los cada vez mais em detrimento à sua oferta no mercado doméstico. O resultado foi a disparada dos preços dos alimentos em um contexto de renda extremamente deprimida.

Assim, em 2020 a fome alcançou números alarmantes. Ainda que não haja estudo definitivo do IBGE, segundo o inquérito da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional a insegurança alimentar grave passou a atingir 9% da população. E, de acordo com o Grupo de Pesquisa Alimento para Justiça, da Universidade Livre de Berlim, esse percentual seria ainda maior, de 15%. A insegurança moderada afligiria, segundo as duas pesquisas, respectivamente 11,5% e 12,4%, perfazendo um total de mais da metade da população com algum tipo de insegurança alimentar (ou seja, incluindo também a leve). Estes números, assombrosos, são de, respectivamente, 55,2% e 59,4%.

Conclui-se que esse cenário desolador de alastramento da fome, nítido na disseminação da mendicância por todo território nacional, decorre de uma política macroeconômica desastrosa somada ao abandono ou redução de políticas sociais voltadas para a questão, justo quando elas se tornam mais necessárias. E como não faltam recursos ao país na moeda que emite, tem-se que esse cenário é consequência direta de escolhas políticas, que privilegiaram atender metas fiscais (inclusive em meio à pandemia) ao invés de atender as necessidades mais básicas da população.

 

*Luciano da Franca Alencar do Rego Barros é economista formado pela UFRJ, possui mestrado em Economia da Indústria e da Tecnologia pela UFRJ e cursa o doutorado no mesmo Programa de Pós-Graduação.

*ADUR ONLINE é um espaço aberto aos docentes e pesquisadores da UFRRJ e de outras Universidades também. As opiniões expressas no texto não necessariamente representam a opinião da Diretoria da ADUR-RJ.


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