A negação do esquecimento
- ADUR

- 1 de abr. de 2023
- 2 min de leitura
01 de abril de 2023 Prof. Ricardo L. Berbara Creio que todos que entram em contato com a questão das ditaduras, dos desaparecidos, da tortura, do silêncio e do medo, o sentimento que se manifesta quase imediatamente é o do diabólico. Isso porque é impossível enfrentar a extrema violência sem que algo em nós sinta a presença de um elemento subumano, de uma força que parece vir das profundezas, daqueles abismos onde a imaginação sempre nos leva em momentos de profundo desalento. É então que o sentimento do diabólico se faz presente como se por um momento tivéssemos voltado às experiências medievais do bem e do mal absolutos, como se apesar de todas as nossas defesas intelectuais o demoníaco estivesse mais uma vez ali nos dizendo: "Está vendo? Eu existo: aí está a prova". Mas o diabólico, infelizmente, é humano, demasiado humano. Ditaduras existem e, no descuido, retornam. São fruto de fragilidades de construções sociais que justificam a eliminação ou o silenciamento de um adversário real ou potencial e, ao mesmo tempo, sem percebermos, pela força narcótica dos instrumentos de comunicação, não têm empatia com o sofrimento e cultuam a morte. As transformam em “mitos”. Entretanto, neste momento de reflexão, em que mais uma vez nos esforçamos em reagir e fortalecer os instrumentos de direitos sempre ameaçados, a presença invisível de milhares e milhares de desaparecidos, torturados e silenciados precede e supera todo o trabalho intelectual que possamos realizar nestes dias. Aqui, devemos senti-los presentes e próximos, sentados entre nós, a olhar-nos, a falar conosco. E a nos negar a opção do esquecimento. É preciso evitar sermos um confortável país em que a memória nada nos ensina. Não. Ou dela tiramos lições, por amargas que sejam, ou a violência estrutural triunfará. Prof. Ricardo L. Berbara Reitor UFRRJ 2017-2021 Diretor da ADUR em três mandatos (1995/1997, 1999/2001, 2009/2011) Departamento de Solos - IA



